sexta-feira, 19 de setembro de 2008

O PERÍODO DEMOCRÁTICO 1945 – 1964

PRIMEIRA PARTE

A CONSTITUIÇÃO DE 1946

Com o fim do Estado Novo, realizaram-se eleições gerais em todo o país. Para a presidência da república, foi eleito o general Eurico Gaspar Dutra. Também foram eleitos deputados federais e senadores com a missão de compor uma Assembléia Constituinte, encarregada de elaborar uma nova Constituição para o país. Entre os senadores, encontrava-se Getúlio Vargas, que não abandonara a vida política e fora eleito com expressivo número de votos.
Instalada em 2 de fevereiro de 1946, a Assembléia Constituinte era composta de representantes dos principais partidos políticos da época: PSD; UDN; PTB e PCB.
Depois de sete meses de trabalho legislativo, a nova Constituição brasileira foi promulgada, em 18 de setembro de 1946. Era uma Constituição liberal, que atendia mais aos interesses dos grandes empresários do que aos trabalhadores. De seu conteúdo, podemos destacar:

· Princípios básicos – estabelecimento da democracia como regime político da nação. Manteve-se a república como forma de governo, a federação como forma de Estado e o presidencialismo como sistema de governo. Ao contrário da centralização de poderes do Estado Novo, essa Constituição conferia poderes ao Legislativo, ao Executivo e ao Judiciário para que atuassem de modo independente e com equilíbrio de forças.

· Direito de voto – voto secreto e universal para os maiores de 18 anos. Continuavam sem direito ao voto analfabetos, cabos e soldados.

· Direito trabalhista – a legislação trabalhista da Era Vargas foi preservada, tendo como novidade a garantia constitucional do direito de greve para os trabalhadores, mediante apreciação da Justiça do Trabalho. Manteve-se o controle dos sindicatos de trabalhadores pelo governo.

· Mandatos eletivos - estabelecimento do mandato presidencial de cinco anos, proibindo-se a reeleição. Os deputados teriam mandato de quatro anos, permitindo-se reeleição. Os senadores teriam mandato de oito anos, sendo em número de três para cada estado da federação.

A Constituição de 1946, que vigorou até 1864, garantia ao cidadão o direito à liberdade de pensamento, crença religiosa, expressão e associação de classe. Mas, na prática das relações sociais, grande parte desses direitos não foram garantidos pelo Poder Judiciário. Nessa época, como em outros períodos, permaneceu no Brasil uma considerável distância entre o país legal e o país real. Até hoje, milhões de brasileiros não dispõem de possibilidades concretas de reivindicar seus direitos junto aos órgãos da justiça.


GOVERNO DUTRA (1946-1950)
Guerra Fria e anticomunismo

O governo do general Dutra foi influenciado pelos acontecimentos internacionais que marcaram o pós-guerra. Entre os vencedores da guerra destacaram-se duas grandes potências: os Estados Unidos, liderando o bloco dos países capitalistas, e a União Soviética, liderando o bloco dos países socialistas. Tensões e conflitos entre esses dois blocos marcaram o período conhecido como Guerra Fria.
Nesse contexto histórico, o governo Dutra aliou-se ao bloco liderado pelo governo dos Estados Unidos, e uma das conseqüências dessa aliança foi o rompimento de relações diplomáticas com a União Soviética, em 1947. Internamente, o governo Dutra, cumprindo decisão do Supremo Tribunal Federal, pôs o Partido Comunista Brasileiro (PCB) na ilegalidade. Todos os parlamentares eleitos por esse partido, entre eles Luís Carlos Prestes (senador), tiveram seus mandatos cassados, acusados principalmente de receber dinheiro e orientação da União Soviética. A vida legal do PCB durou pouco mais de dois anos e meio.
Em relação aos trabalhadores urbanos, o governo agiu de modo autoritário. Os operários faziam greves em várias regiões do país, reclamando dos baixos salários, que não aumentavam havia anos, enquanto o custo de vida continuava subindo. A equipe do governo Dutra defendia que, para combater a inflação, não podia autorizar aumentos salariais. Em nome do combate ao comunismo, o governo suspendeu o direito de greve, interveio em 143 sindicatos e prendeu vários líderes operários.

Novas diretrizes econômicas
Procurando criar uma política de investimentos em setores considerados prioritários – saúde, alimentação, transporte e energia – o governo Dutra elaborou o Plano Salte, sigla formada pelas iniciais desses setores. Sem dinheiro suficiente e competência administrativa, o governo realizou poucos dos objetivos do plano, entre eles a conclusão da rodovia Rio-São Paulo, denominada rodovia Presidente Dutra.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o lucro com as exportações brasileiras superou as despesas com a importação. Assim, o governo conseguiu os compromissos de sua dívida externa e ainda acumular reservas cambiais de milhões de dólares.
No mandato de Dutra, o nacionalismo econômico da Era Vargas foi abandonado: abriu-se a economia do país às empresas estrangeiras, sem a preocupação de incentivar o desenvolvimento industrial nacional. Com essa política de abertura ao produto estrangeiro, o governo Dutra facilitou a importação de bens supérfluos (como brinquedos de plástico, aparelhos de televisão, automóveis, meias de náilon, geladeiras e aparelhos de rádio) e a compra de ferrovias inglesas que haviam sido instaladas no Brasil no século XIX.
Os líderes das entidades industriais brasileiras protestaram contra a liberação indiscriminada das importações, que prejudicava a comercialização dos produtos nacionais. Eles lutavam por uma política de seleção de importações, voltada para a compra de bens de produção (máquinas e equipamentos industriais, combustíveis etc.). Pressionado por grupos nacionalistas, o governo Dutra passou a dificultar as importações, mas já era tarde. Em dois anos, quase 80% da reserva cambial brasileira havia acabado.


O GOVERNO VARGAS (1951-1954)
Nacionalismo e trabalhismo

Nas eleições presidenciais para a sucessão de Dutra, Getúlio Vargas concorreu e venceu, recebendo 48,7% dos votos. O segundo lugar coube ao brigadeiro Eduardo Gomes (UDN) com 29,7% dos votos.
Getúlio dizia que voltava ao poder não apenas como líder político, mas como líder popular. Para conseguir aliados, procurou apagar a imagem de ditador do Estado Novo e construir uma nova figura, de homem democrático.
Já na presidência, retomou duas diretrizes que associara à sua imagem pública: o nacionalismo econômico e a política trabalhista.

O nacionalismo
Vargas empenhou-se em realizar um governo nacionalista, afirmando que era “preciso atacar a exploração das forças internacionais” para que o país conquistasse sua “independência econômica”.
O nacionalismo era duramente combatido pelos representantes do governo dos Estados Unidos e pelos dirigentes das empresas estrangeiras instaladas no Brasil. Havia no Congresso Nacional e na imprensa um grande debate político entre os “nacionalistas” , que apoiavam o governo, e os “internacionalistas”, que pretendiam reabrir a economia do país ao capital estrangeiro. Os nacionalistas chamavam seus adversários de “entreguistas”, acusando-os de querer entregar as riquezas do país à livre exploração estrangeira.
Um dos principais momentos do debate entre os nacionalistas e seus adversários aconteceu por ocasião na nacionalização do petróleo. Os nacionalistas queriam que a exportação do petróleo no Brasil fosse realizada por uma empresa estatal brasileira, e criaram o slogan O petróleo é nosso. Seus oponentes defendiam a exploração do petróleo por grupos internacionais.
A campanha teve um final favorável aos nacionalistas, com a fundação, em 1953, da Petrobras, empresa estatal responsável pelo monopólio da extração e, parcialmente, pelo refino do petróleo brasileiro.
Ainda em 1953, o governo propôs uma Lei de Lucros Extraordinários, que limitava a remessa ao exterior dos lucros das empresas estrangeiras estabelecidas no Brasil. A lei, entretanto, foi barrada no Congresso, devido as pressões de grupos internacionais.
Os adversários do nacionalismo promoveram, então, intensa reação à política de Vargas. O governo dos Estados Unidos mostrava seu desagrado pela criação da Petrobrás e pela Lei de Lucros. A UDN, principal partido de oposição ao governo, e os setores ligados ao capital estrangeiro começaram a conspirar para derrubar Vargas. Um dos principais líderes da oposição era Carlos Lacerda, político ligado à UDN e diretor do jornal Tribuna da Imprensa.

O trabalhismo
Para os trabalhadores urbanos, Vargas dizia que seu objetivo era a construção de uma “verdadeira democracia social e econômica”, em que cada um tivesse, além dos direitos políticos, o direito a desfrutar do progresso que ajudou a construir.
Em 1954, Vargas autorizou um aumento de 100% no salário mínimo, atendendo à proposta do ministro do Trabalho, João Goulart. Essa medida provocou enormes protestos entre os patrões.
Durante essa fase do governo Vargas, o salário mínimo recuperou significativamente seu poder aquisitivo.

Crise política
Os políticos da UDN e a imprensa de oposição atacavam duramente o governo Vargas, acusando-o de corrupção.
Em 5 de agosto de 1954, o líder oposicionista Carlos Lacerda foi vítima de um atentado, ocorrido na rua Toneleiros, em Copacabana, Rio de Janeiro. Lacerda escapou com vida, com um tiro no pé, mas o major da aeronáutica Rubem Vaz, que o acompanhava, morreu.
As investigações posteriores ao crime, conduzidas pela aeronáutica, indicavam que o assassino cumpria ordens de Gregório Fortunato, chefe da guarda presidencial.
As notícias sobre o crime da rua Toneleiros tiveram grande repercussão na imprensa antigetulista. A oposição multiplicava os ataques ao governo federal e tramava derrubar o presidente.
Nos dias 22 e 23 de agosto, manifestações de oficiais militares exigiram a renúncia de Getúlio Vargas, que se recusava a deixar o cargo, embora não tivesse condições para reagir. Isolado politicamente, no dia 24, escreveu uma carta-testamento ao povo brasileiro e, em seguida, suicidou-se com um tiro no coração.
A notícia da morte e a divulgação de sua carta-testamento estimualram manifetações populares por todo o país. Jornais antigetulistas foram invadidos e quebrados, assim como diretórios da UDN e a embaixada dos Estados Unidos no Rio de Janeiro. A morte de Vargas comoveu grande parte da população. Milhares de pessoas compareceram ao seu enterro.
Nos meses que ainda faltavam para completar o mandato de Vargas, a presidência da república foi exercida inicialmente por Café Filho (vice-presidente), afastado por motivos de saúde. Depois, foi provisoriamente ocupada por Carlos Luz (presidente da Câmara dos Deputados) e em seguida por Nereu Ramos (presidente do Senado).

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