sexta-feira, 19 de setembro de 2008

O REGIME MILITAR

SEGUNDA PARTE (1974 – 1985)

Texto adaptado da obra: “História do Brasil”. Boris Fausto. São Paulo: Editora Edusp. 1995.


O governo Geisel
Tal como acontecera com Castelo Branco, Médici não conseguiu fazer seu sucessor. O nome escolhido pelas Forças Armadas para suceder-lhe, foi o do general Ernesto Geisel.
A indicação de Geisel representou um triunfo dos castelistas e, conseqüentemente, uma derrota da linha-dura. Porém, o que pesou na escolha desse candidato foi sua capacidade de comando e suas qualidades administrativas.
A emenda nº 1 da Constituição de 1967 modificou a forma de escolha do presidente da República. Previu-se a criação de um Colégio Eleitoral, composto de membros do Congresso e delegados das Assembléias Legislativas dos Estados. Geisel foi o primeiro presidente escolhido pelo Colégio Eleitoral. Eleito em janeiro de 1974, tomou posse em março daquele ano.

O início da abertura e a eleição de 1974
O governo Geisel se associa ao início da abertura política que o general presidente definiu como lenta, gradual e segura. No entanto, a abertura foi lenta, gradual e insegura, pois a linha-dura se manteve como uma contínua ameaça de retrocesso até o fim do governo Figueiredo.
A estratégia da distensão foi formulada pelo presidente e pelo general Golberi, que voltou ao governo como chefe do gabinete civil da presidência.
A oposição começara a dar em 1973 claros sinais de vida independente; o confronto entre a Igreja Católica e o Estado era também muito desgastante para o governo. A equipe de transição de Geisel tratou aliás de estabelecer pontes com a Igreja, a partir de um ponto comum de entendimento – a luta contra a tortura. Mas a oposição política e a Igreja não eram o termômetro mais sensível a indicar a necessidade da distensão. Esse termômetro se localizava nas relações entre as Forças Armadas e o poder. O poder fora tomado pelos órgãos de repressão, produzindo reflexos negativos na hierarquia das Forças Armadas. Um oficial de patente inferior podia controlar informações, decidir da vida ou morte de pessoas conforme sua inserção no aparelho repressivo, sem que seu superior na hierarquia militar pudesse contrariá-lo. As funções e os princípios básicos das Forças Armadas eram assim distorcidos, trazendo riscos à integridade da corporação militar. Para restaurar a hierarquia, tornava-se necessário neutralizar a linha-dura, abrandar a repressão e, ordenadamente, promover a “volta dos militares aos quartéis”. Por outro lado, lembremos que a “democracia relativa” era uma meta buscada pelo grupo castelista desde 1964.
No curso de 1975, Geisel combinou medidas liberalizantes com medidas repressivas. As últimas eram destinadas a acalmar o “público interno”, ou seja, integrantes da corporação militar. Durante o mês de janeiro, por exemplo, o governo suspendeu a censura ao jornal O Estado de São Paulo; a isto se seguiu uma ousadia maior dos outros jornais, com destaque para a Folha de São Paulo. Por outro lado, o ministro da Justiça, Armando Falcão desfechou uma violenta repressão contra o PCB, acusando-o de estar por trás da vitória eleitoral do MDB.
Um confronto importante entre o governo e a linha-dura ocorreu afinal às claras em São Paulo. Embora a guerrilha tivesse sido eliminada, os militares linha-dura continuavam a enxergar subversivos por toda a parte. Continuava também a prática da tortura, acrescida do recurso ao “desaparecimento” de pessoas mortas pela repressão. Na realidade, esses métodos, justificados por alguns como mal inevitável decorrente de uma “guerra interna”, sobreviveram e até se intensificaram depois de que a “guerra” terminou. Em outubro de 1975, no curso de uma onda repressiva, o jornalista Vladimir Herzog, diretor de jornalismo da TV Cultura, foi intimado a comparecer ao DOI-CODI de São Paulo. Ele era suspeito de ter ligações com o PCB. Herzog apresentou-se ao DOI-CODI e daí não saiu vivo. Sua morte foi apresentada como suicídio por enforcamento, uma forma grosseira de encobrir a realidade: tortura, seguida de morte.
O fato provocou grande indignação em São Paulo, sobretudo nos meios da classe média profissional e da Igreja. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pôs-se à disposição da mulher de Herzog – Clarice- para responsabilizar o Estado pela morte de seu marido. A missa celebrada na Praça da Sé por Dom Evaristo Arns, assistido por dois rabinos e um pastor protestante, foi um ato comovido de repulsa à violência.
Poucos meses mais tarde, em janeiro de 1976, o operário metalúrgico Manuel Fiel Filho foi morto em circunstâncias semelhantes às da morte de Herzog. Mais uma vez, a versão oficial era de suicídio por enforcamento.
O presidente Geisel, que já emitira sinais de descontentamento ao “público interno”, resolveu agir. Um poder paralelo se instalara em São Paulo com as bençãos, ou, no mínimo, a omissão do comandante do II Exército, Ednardo D’Ávila Melo. Geisel substituiu-o por um general de sua inteira confiança – Dilermano Gomes Monteiro -, que começou a usar outra linguagem e a estabelecer pontos de contato com a sociedade. A tortura nas dependências do DOI-CODI cessou, embora as violências em São Paulo não tenham terminado. A linha-dura tinha ainda bastante fôlego.

O “Pacote de Abril”
Após o resultado pleito de novembro de 1974, os confrontos eleitorais passaram a ser uma preocupação para o governo. Haveria eleições municipais em novembro de 1976 e a possibilidade de uma derrota da Arena era real. Meses antes, em julho de 1976, a primeira lei modificadora da legislação eleitoral barrou o acesso dos candidatos ao rádio e à televisão. Nas eleições municipais, os partidos poderiam apresentar no rádio e na TV apenas o nome, número do currículo dos candidatos e uma fotografia destes no caso da televisão. Embora essa lei (Lei Falcão) atingisse em princípio tanto a Arena como o MDB, era o partido da oposição o grande prejudicado. Ele perdia uma oportunidade única de divulgar suas idéias. Mesmo assim, o MDB venceu as eleições para prefeito e conquistou maioria nas Câmaras Municipais em 59 das maiores cidades do país.
Geisel apertou o cerco, introduzindo em abril de 1977 uma série de medidas que ficaram conhecidas como o “pacote de abril”. O “pacote” foi baixado depois de uma crise entre o Executivo e o Congresso, quando o governo não conseguiu a maioria necessária de dois terços para aprovar várias alterações constitucionais. O presidente, em resposta, colocou o Congresso em recesso e, a partir daí, emendou a Constituição e baixou vários decretos-leis.
Entre as medidas do “pacote de abril”, estava a criação da figura do senador biônico, cujo objetivo era impedir que o MDB viesse a ser majoritário no Senado. Os senadores biônicos foram eleitos, ou melhor, “fabricados”, por eleição indireta de um colégio eleitoral, organizado de forma a tornar muito difícil a vitória da oposição. O critério de representação proporcional nas eleições à Câmara dos Deputados foi alterado, de modo a favorecer os Estados do Nordeste. Estes passaram a eleger proporcionalmente maior número de representantes do que os Estados do Centro-Sul. A medida visava favorecer a Arena, que controlava a maioria dos votos no Nordeste. Além disso, o “pacote” estendeu as restrições da Lei Falcão às eleições para os legislativos federal e municipal. O mandato do presidente da República passou de cinco para seis anos.
Ao mesmo tempo, o governo iniciou em 1978 encontros com líderes do MDB, da ABI e representantes da CNBB para encaminhar a restauração das liberdades públicas. Em outubro de 1978, o Congresso aprovou a emenda constitucional número 11, que entrou em vigor a 1º de janeiro de 1979. Seu objetivo principal foi revogar o AI-5, incorporado à Constituição. A partir dessa data, o Executivo já não poderia declarar o Congresso em recesso, cassar mandatos, demitir ou aposentar funcionários a seu critério, privar cidadãos de seus direitos políticos. O direito de requerer habeas corpus foi também restaurado em sua plenitude. Ao mesmo tempo, a emenda número 11 criou ao lado da figura já existente do estado de sítio as chamadas “salvaguardas”, pelas quais o Poder Executivo poderia decretar o estado de emergência e medidas de emergência. As últimas poderiam ser tomadas para restabelecer a ordem pública e a paz social em locais determinados, atingidos por calamidades ou graves perturbações. Essas restrições levaram o MDB a abster-se da votação da emenda.
Na campanha eleitoral de 1978, o MDB obteve 57% dos votos válidos para o Senado, mas não ficou com a maioria daquela casa. Isso se explica porque a representação no Senado não é proporcional, e sim por Estados. Além disso havia a presença dos biônicos. A Arena continuou majoritária na Câmara Federal – 231 cadeiras contra 189 do MDB - manteve-se a concentração de votos no MDB nos Estados mais desenvolvidos e nas grandes cidades – 83% dos votos em São Paulo, 63% no Rio de Janeiro e 62% no Rio Grande do Sul. De qualquer forma, o governo continuava porém a ter maioria no Congresso.

A Política Econômica
Para avaliar a política econômica do governo Geisel, devemos considerar um acontecimento externo negativo, cuja importância é grande embora tenha sido muitas vezes exagerada.
Em outubro de 1973, ainda no período Médici, ocorreu a primeira crise internacional do petróleo. Ela foi conseqüência da chamada Guerra do Yom Kippur, movida pelos Estados árabes contra Israel. Os países árabes produtores de petróleo se articularam para redizir a oferta do produto e provocar forte aumento dos preços. A crise afetou profundamente o Brasil, que importava mais de 80% do total de seu consumo.mas quando o genral Geisel tomou posse em março de 1974, algo do clima de euforia proveniente dos anos do “milagre” ainda persistia. A condução da política econômica ficou nas mãos de Mário Henrique Simonsen, economista conhecido por suas posições ortodoxas.
O novo governo lançou o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND). O Plano buscava completar o processo de substituição de importações instalado há décadas no país, mudando o seu conteúdo. Já não se tratava agora de substituir a importação de bens de consumo, mas de avançar no caminho da autonomia no terreno de insumos básicos (petróleo, aço, alumínio, fertilizantes etc.) e da indústria de bens de capital – aqueles bens que integram o ciclo produtivo mas nele não são consumidos inteiramente (máquinas e ferramentas). A preocupação do II PND com o problema energético era evidente, pois propunha-se o avanço na pesquisa de petróleo, o programa nuclear, a substituição parcial da gasolina pelo álcool, a construção de hidrelétricas – exemplo, Itaipu.
A insistência no crescimento mostrou como era forte a crença nos círculos dirigentes de que o Brasil era um país predestinado a crescer. Porém, para continuar crescendo, seria necessário ampliar o investimento, contando com novos e maiores recursos externos, pois a poupança interna era insuficiente. Esses recursos não faltaram. Eles entraram no país principalmente sob a forma de empréstimos, em sua maioria, contratada a taxa felxíveis de juros; ou seja, os juros não tinham um percentual fixo, oscilando de acordo com a flutuação do mercado. Como o período se caracterizou por uma elevação da taxa internacional de juros, o país passou a arcar com compromissos cada vez mais pesados, correspondentes ao serviço da dívida. Não se pode dizer que os recursos obtidos através dos empréstimos tenham sido jogados pela janela ou engordado o bolso dos corruptos. Essas coisas ocorreram, mas o problema maior resultou da utilização de recursos em projetos dispendiosos, mal administrados, de longo ou duvidoso retorno. Por exemplo, a Ferrovia do Aço teve que ser abandonada; o projeto nuclear foi um desastre econômico e ecológico; o Próalcool, um êxito tecnológico que envolveu entretanto subsídios do Estado aos usineiros.
Em uma análise retrospectiva, podemos ver com maior clareza que o plano sofreu os azares da recessão internacional e da elevação da taxa de juros, tendo também um problema de fundo. Ele se adequava a um esquema de industrialização em via de ser superado nos países de Primeiro Mundo, por suas conseqüências negativas. Indústrias como a do aço, do alumínio, da soda, cloro consomem energia em elevado grau e são altamente poluentes.
Com todas essas ressalvas, é importante assinalar que a partir do II PND alguns ganhos importantes foram alcançados nas substituições de importações – especialmente o petróleo.
Outro problema para a economia do período foi a inflação. A relativa contenção da inflação vinha sendo feita à custa de artifícios, entre eles o da oferta de bens produzidos pelas empresas estatais a preço abaixo do custo, o que tornava essas empresas cada vez mais deficitárias. A indexação anual dos salários, isto é, a sua correção apenas de ano em ano, contribuía para agravar o descontentamento dos assalariados.

Os Movimentos Sociais
O regime militar reprimiu as direções sindicais ligadas ao esquema populista, mas não desmantelou os sindicatos. No campo, a Confederação Nacional dos Trabalhadores Agrícolas (Contag) já em 1968 começou agir independentemente do governo e a incentivar a organização de federações de sindicatos rurais em todo o país.
Lideranças combativas surgiam sob a influência da Igreja através da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Criou-se assim no campo uma situação curiosa em que a política assistencialista do governo favoreceu a emergência de um atuante movimento social. A luta pela posse da terra se manteve e até se ampliou; ao mesmo tempo, greves como a dos cortadores de cana em Pernambuco, iniciadas em 1979, chamaram a atenção para novas realidades do mundo rural.
O movimento operário veio à tona, no governo Geisel, com novo ímpeto e novas feições. A reconstrução do sindicalismo populista era inviável porque o regime não se assentava, nem pretendia se assentar no movimento operário organizado. Desse modo, o movimento sindical ressurgiu adotando formas independentes do Estado, a partir muitas vezes de vivência no interior das empresas onde os trabalhadores organizaram e ampliaram as comissões de fábrica. O eixo mais combativo se deslocou das empresas públicas para a indústria automobilística, que tinha sido um setor pouco atuante até 1964. A grande concentração de trabalhadores em um pequeno número de empresas e a concentração física no ABC paulista foram fatores materiais importantes para a organização do novo movimento operário – em 1976, na capital de São Paulo, existiam no setor automobilístico e mecânico-metalúrgico 421 mil operários.
Outro fator importante foi o trabalho dos organizadores, em que se destacaram lideranças operárias, em vários casos ligados à Igreja. Tiveram também papel importante os advogados sindicais. A aparição do movimento operário à luz do dia relacionou-se ainda com o clima criado pela abertura política, embora a abertura tenha demorado muito tempo para se estender às manifestações coletivas dos trabalhadores.
O Sindicato dos Metarlúrgicos de São Bernardo e Diadema iniciou uma campanha para as grandes greves de 1978 e 1979, que reuniram milhões de trabalhadores. A liderança de Luis Inácio da Silva (Lula), presidente do sindicato, afirmou-se no dia-a-dia e nas grandes assembléias realizadas em São Bernardo, no estádio da Vila Euclides. Os metalúrgicos estiveram à frente dos movimentos, que abrangeram também outros setores.
As greves tinham por objetivo um amplo leque de reivindicações: aumento de salários, garantia de emprego, reconhecimento das comissões de fábrica, liberdades democráticas.

O Governo Figueiredo
Geisel conseguiu fazer o seu sucessor. Foi ele o general João B. Figueiredo, tendo como vice-presidente o ex-governador de Minas Gerais Aureliano Chaves. Essa chapa derrotou a do MDB, formada pelo general Euler Bentes Monteiro e o senador gaúcho Paulo Brossard, na reunião do Colégio Eleitoral de 14 de novembro de 1978. A indicação do general Figueiredo passou por uma séria prova de força, pois o ministro do Exército Sylvio Frota lançara sua própria candidatura, nos meios militares e em sondagens no Congresso, como porta-voz da linha-dura. Frota abriu a campanha eleitoral em maio de 1977, antes do calendário eleitoral previsto por Geisel, e começou a atacar o governo, acusando-o de ser complacente com os subversivos. O presidente demitiu Frota do ministério e cortou sua escalada.
O período Figueiredo combinou dois traços que muita gente considerava de convivência impossível: a ampliação da abertura e o aprofundamento da crise econômica. Pensava-se que as dificuldades econômicas estimulariam conflitos e reivindicações sociais, levando à imposição de novos controles autoritários por parte do governo. O equívoco desse raciocínio estava em fazer da política uma simples decorrência da economia. A abertura, seguiu seu curso, em meio a um quadro econômico muito desfavorável.

Os Problemas Econômicos
Figueiredo manteve Simonsen no Ministério do Planejamento. A tentativa do ministro de impor uma política de restrições sofreu a oposição de vários setores. Dentre eles, destacam-se os empresários nacionais, que se beneficiavam do crescimento com inflação, e muitos componentes do próprio governo interessados em ter condições de gastar e mostrar realizações.
Em agosto de 969, Simonsen deixou o Ministério. Delfim assumiu o cargo, prestigiado como o homem do “milagre”. Agora porém a situação era outra, tanto no plano interno como no internacional. Um segundo choque do petróleo, com a consequente elevação dos preços, agravou o problema do balanço de pagamentos. As taxas internacionais de juros continuavam subindo, complicando ainda mais a situação. A obtenção de novos empréstimos era cada vez mais difícil e os prazos para pagamentos se estreitavam.
Sob pressão dos credores externos, Delfim optou por “frear o carro”, em fins de 1980. A expansão da moeda foi severamente limitada; os investimentos das empresas estatais foram cortados; as taxas de juros internos subiram e o investimento privado também declinou.
A recessão de 1981-1982 teve pesadas conseqüências. Pela primeira vez desde 1947, quando indicadores do PIB começaram a ser estabelecidos, o PIB teve um declínio médio de 1,6%. Os setores mais atingidos foram os indicadores de bens de consumo durável, como, por exemplo, os eletrodomésticos e de bens de capital, concentradas nas áreas urbanizadas do país. O desemprego nessas áreas tornou-se um problema sério. Calcula-se que o declínio da renda foi mais grave do que o ocorrido nos anos seguintes à crise de 1929.
Apesar da imposição de sacrifícios, a inflação não baixou significadamente. Desenhou-se naqueles anos um quadro que se tornaria familiar aos brasileiros, chamado de “estagflação”, por combinar estagnação econômica e inflação.
Afinal, com suas reservas em dólares esgotadas, o Brasil teve de recorrer ao FMI, em fevereiro de 1983.
Em troca de uma modesta ajuda financeira e da tentativa de restaurar sua credibilidade internacional, o país aceitou a receita do FMI. Ela consistia sobretudo em um esforço para melhorar as contas externas do país, mantendo-se o serviço da dívida. Internamente, previam-se cortes de despesas e a compressão ainda mais dos salários. Seguiu-se uma série de discordâncias entre o Brasil e o FMI. No Brasil, havia pressões contra as medidas restritivas e o pagamento dos juros da dívida; o FMI mostrava-se insatisfeito porque o acordo não era cumprido. Nesse clima, os credores internacionais não concederam ao país novos prazos para o pagamento d dívida – o reescalonamento – nem taxas mais favoráveis de juros, como fizeram com o México.
Apesar dos pesares, o esforço por melhorar as contas externas do país deu resultados. A partir de 1984, a economia se reativou, puxada principalmente pelo crescimento das exportações, com destaque par os produtos industrializados. A queda do preço do petróleo fez com que este não pesasse tanto no conjunto das importações. Além disso, houve redução da importação de petróleo e outros produtos, graças aos investimentos realizados a partir do II PND. Mas a inflação continuaria subindo e chegou a 223% ao ano em 1984.
No início de 1985, quando Figueiredo deixou o governo, a situação financeira era de temporário alívio e o país voltara a crescer. Mas o balanço daqueles anos se revela bastante negativo.

Continuação da Abertura Política
Figueiredo prosseguiu no caminho da abertura iniciada pelo governo Geisel. O comando das iniciativas ficou nas mãos do general Golberi e do ministro da Justiça Petrônio Portela.
Em agosto de 1979, Figueiredo tirou das mãos da oposição uma das suas principais bandeiras: a luta pela anistia. A lei de anistia aprovada pelo Congresso continha entretanto restrições e fazia uma importante concessão à linha-dura. Ao anistiar “crimes de qualquer natureza relacionados com crimes políticos ou praticados por motivação política”, a lei abrangia também os responsáveis pela prática da tortura. De qualquer forma, possibilitou a volta dos exilados políticos e foi um passo importante na ampliação das liberdades públicas.
O processo de abertura continuou a ser perturbado no governo Figueiredo pela ação da linha-dura. Bombas explodiram em jornais da oposição e na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Uma carta-bomba, enviada ao presidente da OAB, estourou na sede da entidade, matando sua secretária. Figuras da Igreja ou ligadas à Igreja, como o bispo de Nova Iguaçu, Dom Adriano Hypólito e o jurista Dalmo Dallari, foram vítimas de seqüestros.
Os atos criminosos culminaram com a tentativa de explodir bombas no centro de convenções do Riocentro, a 30 de abril de 1981. Aí se realizava um festival de música, com a presença de milhares de jovens. Uma das bombas não chegou a ser colocada. Explodiu no interior de um carro, ocupado por um sargento e um capitão do Exército; o sargento morreu nos local e o capitão ficou gravemente ferido. A outra bomba explodiu na casa de força do Rio-Centro. O governo conduziu um IPM que confirmou uma absurda versão dos fatos, isentando os responsáveis. Para tanto, chegou ao ponto de substituir um coronel que vinha realizando uma investigação séria. O pedido de demissão de Golberi da chefia da Casa Civil, em agosto de 1981, teve certamente a ver com a manipulação do inquérito.

As Manifestações Eleitorais
A legislação eleitoral aprovada em 1965 tinha-se convertido em armadilha para os detentores do poder. Cada vez mais, as eleições se transformavam em plebiscitos em que se votava pró ou contra o governo. O voto conferido ao MDB abrigava diferentes ideologias e refletia descontentamentos de todo o tipo.
Para tentar quebrar a força da oposição, o governo obteve do Congresso, em dezembro de 1979, a aprovação da Nova Lei Orgânica dos Partidos. A lei extinguiu o MDB e a Arena, obrigando as novas organizações partidárias a serem criadas a conter em seu nome a palavra “partido”. A Arena, que carregava um nome impopular, tratou de mudar de fachada, transformando-se do Partido Demcrático Social (PDS). Os dirigentes do MDB tiveram a habilidade de acrescentar apenas a palavra “partido” à sua sigla; assim, o MDB se converteu no Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB). Mas os tempos de uma oposição unida tinham passado. As suas diferentes tendências ficaram juntas enquanto existia um inimigo comum todo-poderoso. À medida que o regime autoritário foi se abrindo, as diferenças ideológicas e pessoais começaram a emergir.
Esse quadro está presente no surgimento de novos partidos, entre eles, o PT que surgiu a partir do sindicalismo urbano e rural, de setores da Igreja e da classe média profissional. O PT propunha-se representar os interesses das amplas camadas de assalariados existentes no país. Adotando uma postura contrária ao PCB e ao culto da União Soviética, o PT evitou definir-se sobre a natureza do socialismo. Esse fato tinha muito a ver com a existência, em seu interior, de correntes opostas. Em uma ponta ficavam os simpatizantes da social-democracia; na outra, os partidários da ditadura do proletariado. No campo sindical, estabeleceram-se laços íntimos entre o partido e o sindicalismo do ABC. Esse movimento foi um dos centros mais importantes na constituição do PT, com destaque crescente da figura de Lula.
Brizola fundou o Partido Democrático Brasileiro (PDT).
O PTB, por decisão judicial, ficou sob o comando de Ivete Vargas, sobrinha-neta de Getúlio Vargas.
Por último, mencionamos o Partido Popular (PP), cuja duração foi muito curta. Reunindo adversários conservadores do governo, como Tancredo Neves e Magalhães Pinto, o PP procurou ancorar-se nas camadas da burguesia favoráveis a uma transição para a democracia sem grandes mudanças. Se o PDS não tinha nada de “democrático” e de “social”, o PP não tinha nada de popular.
A diferenciação de posições ocorreu também no campo sindical, onde duas correntes principais se definiram. Uma delas muito próxima ao PT, apostava um uma linha reinvidicatória agressiva, em que a mobilização dos trabalhadores era definida como mais importante do que o processo sinuoso da abertura. A outra corrente defendia a necessidade de limitar a ação sindical a lutas que não pusessem em risco o processo de abertura. Não assumia uma clara definição ideológica, sustentando a importância de alcançar ganhos concretos imediatos para os trabalhadores. Daí a expressão “sindicalismo de resultados” que veio a ser criada mais tarde.
Quando a Central Única dos Trabalhadores (CUT) se formou, em 1983, a corrente do “sindicalismo de resultados” não aderiu a ela, realizando um congresso em separado com o nome de Conclat. Posteriormente, em março de 1986, transformou-se na Central Geral dos Trabalhadores (CGT).

As Eleições de 1982
Ao mesmo tempo que contemporizou com a linha-dura no episódio do Riocentro, Figueiredo manteve o calendário eleitoral que previa eleições para novembro de 1982. Obteve do Congresso várias medidas destinadas a cortar as asas da oposição. Dentre elas destaca-se a criação do voto vinculado, pelo qual o eleitor era forçado a escolher candidatos de um mesmo partido em todos os níveis de representação, de vereador a governador. O voto em candidatos de partidos diferentes seria considerado nulo. A medida visava favorecer o PDS que era mais forte no âmbito municipal. Esperava-se que o voto do PDS para vereador puxasse o voto no partido para os outros níveis.
Diante dessa transformação legal, o PP incorporou-se ao PMDB.
Os resultados para o Congresso marcaram uma vitória do PDS no Senado. Na Câmara dos Deputados, o PDS também foi o partido mais votado, mas não conseguiu maioria absoluta (PDS 235 cadeiras, PMDB 200, PDT 24, PTB 13 e PT 8).
Na eleição de governador, as oposições conseguiram algumas vitórias expressivas. O PDS perdeu em Estados importantes como: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Paraná.

A Campanha das “Diretas Já”
No curso de 1983, o PT assumiu como uma de suas prioridades promover uma campanha pelas eleições diretas para a presidência da República. Pela primeira vez, sua direção dispôs-se a entrar em uma frente com outros partidos – PMDB e PDT. A campanha cresceu e foi além das organizações partidárias, convertendo-se em uma quase unanimidade nacional. Milhões de pessoas encheram as ruas de São Paulo e do Rio de Janeiro, com um entusiasmo raramente visto no país. a população punha todas as suas esperanças nas diretas: a expectativa de uma representação autêntica, mas também a resolução de muitos problemas (salário baixo, segurança, inflação) que apenas a eleição direta de um presidente da República não poderia solucionar.
Havia porém uma distância entre a manifestação de rua e o Congresso com maioria do PDS. A eleição direta dependia de uma alteração constitucional, pelo voto de 2/3 dos membros do Congresso. Para que isso acontecesse, seria necessário que muitos congressistas do PDS votassem a favor das diretas. A emenda constitucional (Dante de Oliveira) foi votada sob grande expectativa popular, mas não passou.

As Eleições Indiretas
A rejeição das eleições diretas para presidente provocou uma grande frustração popular. A batalha sucessória fixou-se no Colégio Eleitoral. Três figuras apareciam como candidatos prováveis do PDS: o vice-presidente Aureliano Chaves, o ministro do Interior Mário Andreazza, que era coronel do Exército, e Paulo Maluf.
A escolha do candidato do governo já não passava em 1984 pela corporação militar, embora os militares tivessem algum peso na decisão. Maluf realizou uma intensa campanha junto aos convencionais do PDS que escolheriam o candidato, prometendo-lhes cargos e toda sorte de atenções. A vitória de Maluf (1984), na convenção do partido, frente a Mario Andreazza, provocou a cisão final das forças do PDS que apoiavam os outros candidatos. Já em julho, Aureliano Chaves retirara sua candidatura e passara a trabalhar na organização de uma dissidência com o nome de Frente Liberal, que deu origem a um novo partido – Partido da Frente Liberal (PFL). A Frente Liberal aproximou-se do PMDB, que lançara o nome de Tancredo Neves à presidência da República. As duas forças chegaram a um acordo, formando a Aliança Democrática, em oposição a Maluf. Tancredo foi indicado para a presidência e José Sarney para a vice-presidência. Sarney era visto com muitas restrições pelo PMDB, pois pouco ou nada tinha a ver com a bandeira de democratização levantada pelo PMDB.
A 15 de janeiro de 1985, Tancredo e Sarney obtiveram uma vitória nítida no Colégio Eleitoral, batendo Maluf por 480 votos a 180. O PDT votou com Tancredo. O PT absteve-se de votar, em protesto contra a eleição indireta.
Com a eleição de Tancredo Neves a transição para o regime democrático não terminou e estaria sujeita ainda a imprevistos.
A posse de Tancredo não aconteceu, devido a uma doença, o presidente morreu a 21 de abril, assumindo a presidência da República o vice-presidente José Sarney.

O REGIME MILITAR (1964 – 1985)

PRIMEIRA PARTE (1964 a 1973)

Texto adaptado da obra “História do Brasil”. Boris Fausto. São Paulo: Editora Edusp. 1995


O Ato Institucional Nº 1 e a Repressão
O governo instaurado após o golpe de Estado de 1964, começou a mudar as instituições do país através de decretos, chamados Atos Institucionais (A I), que eram justificados como decorrência do “exercício do Poder Constituinte, inerente a todas as revoluções”.
O AI-1 foi baixado a 9 de abril de 1964, pelos comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. Formalmente, manteve a Constituição de 1946 com várias modificações, assim como o funcionamento do Congresso. Este último aspecto seria uma das características do regime militar. Embora o poder real se deslocasse para outras esferas e os princípios básicos da democracia fossem violados, o regime quase nunca assumui expressamente sua feição autoritária. O próprio AI-1 tinha sua vigência limitada até 31 de janeiro de 1966.
Várias das medidas do AI-1 tinham por objetivo reforçar o Poder Executivo e reduzir o campo de ação do Congresso. O presidente da República ficava autorizado a enviar ao Congresso projetos de lei que deveriam ser apreciados no prazo de trinta dias na Câmara e em igual prazo no Senado; caso contrário, seriam considerados aprovados. Como era fácil obstruir votações no Congresso e seus trabalhos normalmente se arrastavam, a aprovação de projetos do Executivo “por decurso de prazo” se tornou um fato comum.
O AI-1 suspendeu as imunidades parlamentares, e autorizou o comando supremo da revolução a cassar mandatos em qualquer nível – municipal, estadual e federal – e a suspender direitos políticos pelo prazo de dez anos. As garantias de vitaliciedade, assegurada aos magistrados, pela qual eles têm direito a permanecer em seu cargo, e de estabilidade, conferida aos demais servidores públicos, foram suspensas por seis meses para facilitar o expurgo no serviço público.
O ato criou também as bases para a instalação dos Inquéritos Policial – Militares (IPMs), a que ficaram sujeitos os responsáveis “pela prática de crime contra o Estado ou seu patrimônio e a ordem pública e social ou por atos de guerra revolucionária”. A partir desses poderes excepcionais, desencadearam-se perseguições aos adversários do regime, envolvendo prisões e torturas. Mas o sistema ainda não era inteiramente fechado. Existia a possibilidade de se utilizar o recurso do habeas corpus perante os tribunais, e a imprensa se mantinha relativamente livre.
Os estudantes que tinham tido um papel de relevo no período Goulart foram especialmente visados pela repressão. Logo a 1º de abril, a sede da UNE no Rio de Janeiro foi invadida e incendiada. Após a sua dissolução, a UNE passou a atuar na clandestinidade. As universidades constituíram outro alvo privilegiado.
Mas a repressão mais violenta concentrou-se no campo, especialmente no Nordeste, atingindo sobretudo gente ligada às Ligas Camponesas. Nas cidades, houve intervenção em muitos sindicatos e federações de trabalhadores e a prisão de dirigentes sindicais.
Em junho de 1964, o regime militar deu um passo importante no controle das cidades, com a criação do Serviço Nacional de Informações (SNI). Seu principal idealizador e primeiro chefe foi o general Golberi do Couto e Silva. O SNI tinha como principal objetivo expresso “coletar e analisar informações pertinentes à segurança nacional, à contra-informação e à informação sobre questões de subversão interna”. Na prática, transformou-se em um centro de poder quase tão importante quanto o Executivo, agindo por conta própria na “luta contra o inimigo interno”. O general Golberi chegou mesmo a tentar justificar-se, anos mais tarde, dizendo que sem querer tinha criado um monstro.

O Governo Castelo Branco
O AI-1 estabeleceu a eleição de um novo presidente da República, por votação indireta do Congresso Nacional. A 15 de abril de 1964, o general Humberto de Alencar Castelo Branco foi eleito presidente, com mandato até 31 de janeiro de 1966.
Os homens que assumiram o poder formavam em sua maioria um grupo com fortes ligações com a ESG.
O grupo castelista tinha, no plano político, o objetivo de instituir uma “democracia restringida” depois de realizar as cirurgias previstas no AI-1; no plano econômico, visava reformar o sistema capitalista, modernizando-o com um fim em si mesmo e como forma de conter a ameaça comunista. Para atingir esses propósitos, era necessário enfrentar a caótica situação econômico-financeira que vinha dos últimos meses do governo Goulart; controlar a massa trabalhadora do campo e da cidade; promover uma reforma do aparelho do Estado.

O Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG)
O PAEG tratou de reduzir o déficit do setor público, contrair o crédito privado e comprimir salários.
Obteve-se o aumento da arrecadação de impostos por um melhor aparelhamento da máquina do Estado, que era deficiente. A introdução da correção monetária para o pagamento de impostos em atraso contribuiu também para que, pelo menos em parte, ser devedor do Estado deixasse de ser um excelente negócio. A compressão dos salários começou a ser feita pela fixação de fórmulas de reajuste inferiores à inflação. Ela veio acompanhada de medidas destinadas a impedir as greves e a facilitar a rotatividade na mão-de-obra, no interesse das empresas.
O governo liquidou um dos direitos mais valorizados pelos assalariados urbanos – a estabilidade no emprego após dez anos de serviço, garantida pela CLT. A fórmula não surgiu imediatamente, mas só em setembro de 1966, quando foi criado o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), na prática em substituição à estabilidade.
A criação do fundo foi vantajosa para os empregadores, que passaram a contratar e dispensar seus empregados livremente. E trouxe para o trabalhador conseqüências negativas. Além de ser corroído pela correção monetária abaixo da inflação e pelo não-recolhimento de parcelas, o dinheiro do fundo não compensa a perda da garantia de estabilidade.
Com relação ao campo, a política repressiva do governo Castelo contra os chamados agitadores veio acompanhada de medidas que procuravam encaminhar soluções para o problema da terra. Porém essas medidas ficaram em grande medida no papel, não ganharam dimensão prática.
Uma das mudanças de enfoque importantes dos ministros Roberto Campos (Planejamento) e Otávio Gouveia de Bulhões (Fazenda) se deu na área do comércio exterior. Lançaram uma campanha de exportação não apenas para explorar as enormes reservas naturais do país e vender produtos agrícolas como para promover os bens manufaturados. Eles esperavam contar com a entrada de capital estrangeiro, especialmente no setor de exportação.
O PAEG alcançou seus objetivos. A combinação do corte de despesas e aumento da arrecadação reduziu o déficit público e a inflação tendeu a ceder gradativamente, e o PIB voltou a crescer, a partir de 1966.

A Política
O AI-1 não tocara no calendário para as eleições ao governo dos Estados. Em outubro de 1965, realizaram-se eleições diretas em 11 deles. A esta altura, grande parte do entusiasmo pela revolução, entre seus próprios adeptos, tinha declinado. Era difícil iludir-se com a propaganda sobre o fim da corrupção, e os bolsos das classes médias estavam vazios. Apesar do veto a determinados candidatos por parte da chamada linha-dura das Forças Armadas, a oposição triunfou em vários Estados importantes (Guanabara, Minas Gerais, Santa Catarina, Mato Grosso e Brasília). O resultado das urnas alarmou os meios militares e sob pressão dos setores da linha-dura, Castelo baixou o AI-2 (17 de outubro de 1965). O AI-2 estabeleceu em definitivo que a eleição para presidente e vice-presidente da República seria realizada pela maioria absoluta do Congresso Nacional, em sessão pública e votação nominal. Evitava-se assim o voto secreto para prevenir surpresas.
O AI-2 reforçou ainda mais os poderes do presidente da República ao estabelecer que ele poderia baixar atos complementares ao ato , bem como decretos-leis em matéria de segurança nacional. Mas a medida mais importante do AI-2 foi a extinção dos partidos políticos existentes. A legislação partidária forçou na prática a organização de apenas dois partidos: a Aliança Renovadora Nacional (ARENA), que agrupava os partidários do governo, e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que reunia a oposição. A maior parte dos políticos que se filiaram à Arena tinha pertencido à UDN e em número quase igual ao PSD; o MDB foi formado por figuras do PTB, vindo a seguir o PSD.

O AI-4, Constituição de 1967 e a Sucessão Presidencial
Nas eleições legislativas de 1966, a Arena obteve 63,9% dos votos válidos para a Câmara dos Deputados e o MDB, 36%.
O governo Castelo completou as mudanças nas instituições do país, fazendo aprovar pelo Congresso uma nova Constituição em janeiro de 1967.
O Congresso fora fechado por um mês em outubro de 1966, submetido a novas cassasões e reconvocado pelo AI-4 para se reunir extraordinariamente a fim de aprovar o novo texto constitucional. A Constituição de 1967 incorporou a legislação que ampliara os poderes conferidos ao Executivo, especialmente em matéria de segurança nacional, mas não manteve os dispositivos excepcionais que permitiam novas cassasões de mandatos, perda de direitos políticos etc.
Na aparência, de acordo com a legislação, era o Congresso quem elegia o presidente da República, indicado pela Arena. Mas o Congresso, descontados os votos da oposição, apenas sacramentava a ordem vinda de cima.
O grupo castelista não conseguiu fazer o sucessor de Castelo. Foram eleitos presidente o general Artur da Costa e Silva e para vice-presidente, o udenista mineiro Pedro Aleixo. Eles tomaram posse em março de 1967.
Apesar de ter sido ministro da Guerra de Castelo Branco, Costa e Silva era uma figura estranha ao grupo da Sorbonne. Seu estilo não coincidia com o do intelectualizado Castelo. Ele não se interessava por leituras complicadas sobre estratégia militar, preferindo coisas mais leves e corridas de cavalo. Mais significativo do que essa diferença de personalidades era o fato de que Costa e Silva concentrava as esperanças da linha-dura e dos nacionalistas autoritários das Forças Armadas.

A Oposição se Articula
Desde 1966, passado o primeiro impacto da repressão, a oposição vinha se rearticulando. Muitos membros da hierarquia da Igreja se defrontaram com o governo, destacando-se no Nordeste a atuação do bispo de Olinda e Recife, Dom Hélder Câmara. Os estudantes começaram também a se mobilizar em torno da UNE.
No cenário político, colocado à margem, Lacerda se aproximou de seus inimigos tradicionais Jango e Juscelino para formar a Frente Ampla. Reunidos em Montevidéu, os líderes da Frente Ampla se propuseram lutar pela redemocratização do país e a afirmação dos direitos dos trabalhadores. Em 1968, as mobilizações ganharam ímpeto. 1968 não foi um ano qualquer. Em vários países, os jovens se rebelaram, embalados pelo sonho de um mundo novo. Buscava-se revolucionar todas as áreas do comportamento, em busca da liberação sexual e da afirmação da mulher. As formas políticas tradicionais eram vistas como velharias e esperava-se colocar “a imaginação no poder”. No Brasil, submetido a uma ditadura militar, era um árduo caminho colocar “a imaginação no poder”. O catalizador das manifestações de rua em 1968, foi a morte de um estudante secundarista. Edson Luís foi morto pela Polícia Militar durante um pequeno protesto realizado no Rio de Janeiro (março de 1968), contra a qualidade da alimentação fornecida aos estudantes pobres no restaurante Calabouço. Seu enterro e missa rezada na igreja da Candelária foram acompanhadas por milhares de pessoas. A indignação cresceu com a ocorrência de novas violências.
Esses fatos criaram condições para uma mobilização mais ampla, reunindo não só estudantes como setores representativos da Igreja e das classes médias do Rio de Janeiro. O ponto alto da convergência dessas forças que se empenhavam na luta pela redemocratização foi a chamada passeata dos 100 mil (25 de junho de 1968).
Ao mesmo tempo, ocorreram duas greves operárias agressivas – as de Contagem, perto de Belo Horizonte, e a de Osasco, na Grande São Paulo, que teve características diferentes. Enquanto a de Contagem foi até certo ponto espontânea, a de Osasco resultou de um trabalho conjunto de trabalhadores e de estudantes. A prova de força com o governo, tendo a greve como instrumento, deu mau resultado. O Ministério do Trabalho interveio no Sindicato dos Metalúrgicos, forçando seu presidente José Ibraim a optar pela clandestinidade. Pesado aparato militar realizou com violência a desocupação da Cobrasma, invadida pelos grevistas.

O Início da Luta Armada
A greve de Osasco sofreu influência de grupos de esquerda que tinham assumido a perspectiva de que só a luta armada poria fim ao regime militar.
No Brasil, a organização tradicional de esquerda – o PCB – opunha-se à luta armada. Em 1967, um grupo liderado pelo veterano comunista Carlos Marighella rompeu com o partido e formou a Aliança de Libertação Nacional (ALN). Grupos novos foram surgindo, entre eles o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8) e a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), esta última com forte presença de militares de esquerda, como por exemplo, o tenente do Exército, Carlos Lamarca.
Os grupos de luta armada começaram suas primeiras ações em 1968. Uma bomba foi colocada no consulado norte-americano em São Paulo, surgiram também as “expropriações”, ou seja assaltos para reunir fundos. A ALN realizou um assalto espetacular a um trem pagador da Santos-Jundiaí.
Todos esses fatos eram suficientes para reforçar a linha-dura na sua certeza de que a revolução estava se perdendo e era preciso criar novos instrumentos para acabar com os subversivos. O pretexto para pôr fim à liberalização restrita foi um fato aparentemente sem maior importância. O deputado Márcio Moreira Alves, eleito pelo MDB da Guanabara, fez um discurso em que concitava a população a boicotar a parada militar de 7 de setembro, sugerindo ainda às mulheres que se recusassem a namorar oficiais que silenciassem diante da repressão ou participassem de atos de violência. O texto do discurso – ignorado pelo grande público – foi distribuído nas unidades das Forças Armadas. Criado o clima de indignação, os ministros militares requereram ao STF fosse aberto um processo criminal contra Moreira Alves, por ofensas à honra e à dignidade das Forças Armadas. O processo dependia de licença do Congresso, que era necessária porque a Constituição de 1967 que estava em vigor garantia a imunidade dos parlamentares. Em decisão inesperada, o Congresso, por 216 votos contra 141, negou-se a suspender as imunidades. Menos de 24 horas depois, a 13 de dezembro de 1968, Costa e Silva baixou o AI-5, fechando o Congresso.

O AI-5
O AI-5 foi um instrumento de um golpe de Estado dentro do golpe de Estado de 1964. Ao contrário dos atos anteriores, não tinha prazo de vigência e não era, pois, uma medida excepcional transitória. Ele durou até o início de 1979.
O presidente da República voltou a ter poderes para fechar provisoriamente o Congresso. Podia além disso intervir nos Estados e municípios, nomeando interventores. Restabeleciam-se os poderes presidenciais para cassar mandatos e suspender direitos políticos, assim como demitir ou aposentar servidores públicos.
Foi suspensa a garantia de habbeas corpus aos acusados de infrações contra a segurança nacional.
Estabeleceu-se na prática a censura aos meios de comunicação; a tortura passou a fazer parte integrante dos métodos do governo.
A partir de 1968, a ações armadas de esquerda se multiplicaram, enquanto o governo seguia cada vez mais o curso de uma ditadura brutal.

A Junta Militar
Em agosto de 1969, Costa e Silva foi vítima de um derrame que o deixou paralisado. Os ministros militares decidiram substituí-lo, violando a regra constituicional que apontava como substituto o vice-presidente Pedro Aleixo. Além de ser civil, Pedro Aleixo tinha o grave defeito de ter-se oposto ao AI-5. Desse modo, através de um Ato Institucional (AI-12 de 31 de agosto de 1969), os ministros Lira Tavares, do Exército, Augusto Rademaker, da Marinha, e Márcio de Sousa e Melo, da Aeronáutica, assumiram temporariamente o poder.
A resposta dos grupos radicais de esquerda ao aumento da repressão traduziu-se no seqüestro de membros do corpo diplomático estrangeiro para trocá-los por prisioneiros políticos. A ação de maior repercussão foi o seqüestro do embaixador dos Estados Unidos da América, realizado no Rio de Janeiro pela ALN e o MR-8, apenas quatro dias após a junta militar ter-se instalado no poder. Os grupos armados conseguiram a libertação de quinze presos políticos, que foram transportados para o México, em troca da liberdade do embaixador Elbrik.
Através do AI-13, a junta criou a pena de banimento do território nacional, aplicável a todo brasileiro que “se tornar incoveniente, nocivo ou perigoso à segurança nacional”. Estabeleceu-se pelo AI-14 a pena de morte para os casos de “guerra externa, psicológica adversa, ou revolucionária ou subversiva”.
A pena de morte nunca foi aplicada formalmente, preferindo-se a ela as execuções sumárias ou no correr de torturas, apresentadas como resultantes de choques entre subversivos e as forças da “ordem” ou como desaparecimentos misteriosos.
Enquanto o país vivia um dos seus períodos políticos mais tenebrosos, o governo alcançava êxitos na área econômica. Reequilibrando as finanças, através de uma recessão relativamente curta. Delfim Netto tratou de incentivar o crescimento econômico, facilitando a expansão do crédito.

O Governo Médici
Em meados de outubro de 1969, Costa e Silva ainda vivia, mas sem possibilidades de recuperação. Diante disso, a junta militar declarou vagos os cargos de presidente e vice-presidente da República, marcando eleições, pelo Congresso Nacional, para o dia 25 de outubro. Determinou ainda que o mandato do futuro presidente começaria a 30 de outubro e terminaria a 15 de março de 1974.
O Alto Comando das Forças Armadas escolheu para presidente o general Emílio Garrastazu Médici e para vice-presidente o ministro da Marinha Augusto Rademaker.

O Declínio da Luta Armada
Os grupos armados urbanos, que a princípio deram a impressão de desestabilizar o regime com suas ações espetaculares, declinaram e praticamente desapareceram. Esse desfecho resultou em primeiro lugar da eficácia da repressão, que acabou com os ativistas da luta armada e seus simpatizantes – a chamada “rede de apoio”, constituída sobretudo de jovens profissionais. Outra razão para o declínio foi o fato de os grupos armados isolarem-se da massa da população, cuja atração por suas ações era mínima, para não dizer nenhuma. A esquerda radical equivocara-se completamente, pensando poder criar no Brasil uma nova Cuba.
Carlos Marighella morreu em novembro de 1969, em uma emboscada policial fruto de informações obtidas através da tortura.
Carlos Lamarca foi morto em setembro de 1971, no interior da Bahia.
Restou um foco de guerrilha rural que o PC do B começou a instalar em uma região banhada pelo rio Araguaia, próxima a Marabá, situada no leste do Pará – o chamado Bico do Papagaio, nos anos 1970-71.
Foi só em 1975, após transformar a região em zona de segurança nacional, que as forças do Exército conseguiram liquidar ou prender o grupo do PC do B. Tudo isso não chegou ao conhecimento do grande público, pois a divulgação do assunto era proibida.
Por outro lado a oposição legal chegou a seu nível mais baixo no governo Médici, como resultado das condições econômicas favoráveis e da repressão.

A Arma da Propaganda
O governo Médici distinguiu claramente entre um setor significativo mais minoritário da sociedade, adversário do regime, e a massa da população que vivia um dia-a-dia de alguma esperança nesses anos de prosperidade econômica.
A repressão acabou com um setor, enquanto a propaganda encarregou-se de, pelo menos, neutralizar o segundo. Para alcançar este último objetivo, o governo contou com o grande avanço das telecomunicações no país, após 1964. As facilidades de crédito pessoal permitiram a expansão do número de residências que possuíam TV. Por essa época, beneficiada pelo apoio do governo, de quem se transformou em porta-voz, a TV Globo expandiu-se até se tornar rede nacional e alcançar praticamente o controle do setor. A propaganda governamental passou a ter um canal de expressão como nunca existira na história do país. Foi a época da promoção do “Brasil grande potência”, do “Ninguém segura este país”, da marchinha Prá Frente Brasil, que embalou a grande vitória da seleção brasileira na Copa do Mundo de 1970, dos adesivos “Brasil: ame-o ou deixe-o”. Foi a época que muitos brasileiros idosos de classe média lamentaram não ter condições biológicas para viver até o novo milênio, quando o Brasil se equipararia ao Japão.

O “Milagre Brasileiro”
O período chamado “milagre” estendeu-se de 1969 a 1973, combinando o extraordinário crescimento econômico com taxas relativamente baixas de inflação. O PIB cresceu na média anual de 11,2%. A inflação média anual não passou de 18%. Isso parecia de fato um milagre. Só que o fenômeno tinha uma explicação terrena e não podia durar indefinidamente.
A equipe econômica do “milagre”, com Delfim á frente, beneficiou-se, em primeiro lugar de uma situação da economia mundial caracterizada pela ampla disponibilidade de recursos. Assim, ao lado do crescimento dos empréstimos, cresceu no Brasil o investimento de capital estrangeiro. Um dos setores mais importantes do investimento estrangeiro foi o da indústria automobilística, que liderou o crescimento industrial com taxas anuais acima de 30%.
Houve também uma grande expansão do comércio exterior. A importação ampliada de determinados bens era necessária para sustentar o crescimento econômico. As exportações se diversificaram e nas exportações agrícolas, destacou-se o avanço da soja, cujos preços no mercado internacional eram bastante favoráveis.
Outro fator a ser destacado é o aumento da capacidade de arrecadar tributos, por parte do governo. Esse fato contribuiu para a redução do déficit público e da inflação.
A política de Delfim se destinava a promover o que se chamou de desenvolvimento capitalista associado. Essa política não aplicava uma receita liberal, deixando à “mão invisível do mercado” a tarefa de promover o desenvolvimento. Pelo contrário, o Estado intervinha em uma extensa área, indexando salários, concedendo créditos, isenções de tributos aos exportadores etc.
A fórmula do “milagre” não tinha por trás dela o FMI. O FMI criticou-a, entre outros pontos, por facilitar a convivência com a inflação no presente mas dificultar a resolução do problema no futuro.
Quais eram os pontos fracos do “milagre”?
Devemos distinguir entre os pontos vulneráveis e pontos negativos. O principal ponto vulnerável estava em sua excessiva dependência do sistema financeiro e do comércio internacional, que eram responsáveis pela facilidade dos empréstimos externos, pela inversão de capitais estrangeiros, pela expansão das exportações etc. Outro ponto vulnerável era a necessidade cada vez maior de contar com determinados produtos importados, dos quais o mais importante era o petróleo. Os aspectos negativos do “milagre” foram principalmente de natureza social.
A política econômica de Delfim tinha o propósito de fazer crescer o bolo para só depois pensar em distribuí-lo. Alegava-se que antes do crescimento pouco ou nada havia para distribuir. Privilégiou-se assim a acumulação de capitais através das facilidades já apontadas e da criação de um índice prévio de aumento de salários em nível que subestimava a inflação. O impacto social da concentração de renda foi entretanto atenuado. A expansão das oportunidades de emprego permitiu que o número de pessoas que trabalhavam, por família urbana, aumentasse bastante, fato que compensou a diminuição do ganho individual.
Outro aspecto negativo do “milagre” que perdurou depois dele foi a desproporção entre o avanço econômico e o retardamento ou mesmo abandono dos programas sociais pelo Estado. O Brasil iria se notabilizar no contexto mundial por uma posição relativamente destacada pelo seu potencial industrial e por indicadores muito baixos de saúde, educação e habitação, que medem a qualidade de vida de um povo.
O “capitalismo selvagem” caracterizou aqueles anos e os seguintes, com seus projetos que não consideravam nem a natureza nem as populações locais. O projeto da Transamazônica é um exemplo. Ela foi construída para assegurar o controle brasileiro na região e para assentar em agrovilas trabalhadores nordestinos. Após provocar muita destruição e engordar as empreiteiras, a obra resultou em fracasso.

O REGIME MILITAR (1964 – 1985

O BRASIL DA DITADURA MILITAR: OS ANOS DE CHUMBO

O golpe de 1964 deu início a uma série de governos militares, que permaneceram no poder até 1985. durante esse tempo, montou-se uma ordem política caracterizada pela anulação das liberdades democráticas. Progressivamente, organizou-se uma estrutura política, que fez do presidente da República autoridade quase absoluta do país. Com poderes concentrados no Executivo, limitou-se a atuação do Legislativo e do Judiciário, transformados em poderes submissos. Os poderes estaduais e municipais perderam também autonomia, passando a simples executores das decisões federais.
O regime militar caracterizou-se, assim, pelo centralismo e pelo autoritarismo, recorrendo freqüentemente à repressão e à violência para silenciar seus opositores.
Na área econômica, os governos promoveram a abertura do mercado ao capital e às empresas estrangeiras, ampliando a internacionalização da economia nacional. O processo foi acompanhado de estabilização financeira e crescimento econômico acentuado, sobretudo entre 1970 e 1973. pelas altas taxas de crescimento, esses anos ficaram conhecidos como milagre econômico.
A ditadura militar constituiu eficiente serviço de propaganda, que buscava despertar o sentimento de patriotismo na população, com slogans como Este é um país que vai pra frente; Ninguém segura este país; Brasil, potência do ano 2000; Brasil, ame-o ou deixe-o. A repressão era o principal pilar de sustentação do regime, e muitos opositores foram exilados ou mortos.
Os governos militares realizaram obras públicas de grande vulto, à custa de empréstimos externos, como a Transamazônica, a ponte Rio-Niterói, a usina hidrelétrica de Itaipu e a usina nuclear de Angra dos Reis.
A partir de 1974, a economia nacional começou a dar sinais de crise. As principais dificuldades associavam-se ao crescimento obtido à custa do capital estrangeiro. De um lado, essa política possibilitou a crescente concentração de renda; de outro, o aumento da dívida externa, que atingiu proporções inusitadas, obrigando o pagamento de juros altíssimos e inviabilizando o crescimento econômico.
O quadro era agravado pela crise internacional do petróleo. Desde 1972, os países produtores passaram a elevar o preço do produto, desencadeando uma crise mundial e trazendo sérios problemas para o setor energético nacional. Assim, enquanto o país conquistava a posição de 10º economia do mundial, a qualidade de vida de sua população atingia níveis baixíssimos.
O modelo econômico dos militares, ao mostrar ineficiência, deu margem para o crescimento da oposição. Teve início, então, um processo de abertura política, lenta e gradual, que levaria à democratização dos país.
Durante a ditadura militar, cresceu a influência da televisão, que tornou-se o mais importante meio de comunicação do país. Integrada às transmissões internacionais via satélite, ela ganhou cor em 1972. No início dos anos 1980, existiam mais de 120 emissoras no país, dominadas por poucos grupos concentrados no eixo Rio-São Paulo.
O período militar transformou o país também num cenário de fortes contrastes sociais: grandes e caóticas cidades, periferias superpovoadas, aumento da violência, desigualdades sociais, concentração de renda, conflitos pela posse de terra.


O GOVERNO DO MARECHAL CASTELO BRANCO (1964 – 1967)

O golpe que derrubou o presidente João Goulart instalou uma junta militar no poder, formada pelo general Artur da Costa e Silva, o brigadeiro Correia de Melo e o almirante Augusto Rademaker. A primeira medida resumiu-se da decretação do Ato Institucional nº 1 (AI-1), que garantia ao Executivo amplos poderes, como o de cassar mandatos, suspender direitos políticos, aposentar funcionários civis e militares e decretar estado de sítio sem autorização do Congresso.
Em seguida o Alto Comando das Forças Armadas indicou para a presidência o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco. No início do governo, ele autorizou inúmeras prisões, intervenções em sindicatos e organizações populares e a interrupção de mandatos políticos. Entre os políticos que perderam seus direitos estavam os ex-presidentes Jango, Juscelino e Jânio Quadros.
Considerando o país ameaçado pelos comunistas, pela subversão e pela corrupção, o governo determinou, ainda, o fechamento de espaços democráticos e a criação do Serviço Nacional de Informação (SNI).
Em 1965, foi decretado o Ato Institucional nº 2 (AI-2), que estabelecia eleições indiretas para a presidência da República; extinguia os partidos políticos existentes e criava duas novas agremiações: a ARENA (Aliança Renovadora Nacional), aglutinando os aliados da ditadura, e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), partido de oposição.
Seguiram-se outros atos institucionais: o de nº 3 (AI-3) determinou que os governadores dos estados também seriam eleitos por via indireta; o de nº 4 (AI-4) definiu as orientações que deveriam nortear a elaboração da nova Constituição, promulgada em janeiro de 1967. A Carta dos militares incorporava os Atos Institucionais, confirmava o caráter autoritário do regime e atribuía hegemonia política ao Executivo.
Na área econômica concretizou-se o total alinhamento aos Estados Unidos, propiciando facilidades para a penetração do capital estrangeiro. O Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG) congelou os salários, restringindo o crédito e criou o Banco Nacional de Habitação (BNH), para desenvolver a área da construção civil e ampliar o número de empregos.
O PAEG visava combater a inflação por meio do arrocho salarial. As grandes empresas nacionais e estrangeiras foram as mais favorecidas. Em resumo, o plano beneficiava uma minoria da população e concentrava as riquezas nas mãos de poucos.
Após a morte de Castelo Branco, o ministro da Guerra, marechal Artur da Costa e Silva, foi indicado pelo Alto Comando Militar para a presidência. A indicação foi aceita sem resistência significativa da sociedade, já amedrontada pelos atos de exceção dos militares.


O GOVERNO DO MARECHAL COSTA E SILVA (1967-1969)
Costa e Silva teve de enfrentar constantes manifestações contra o regime ditatorial, que se intensificaram devido às dificuldades econômicas do país. Políticos cassados pela ditadura, estudantes e trabalhadores de diversas categorias aliaram-se, por exemplo, para formar a Frente Ampla. No ano de 1968, foram constantes as manifestações estudantis, exigindo a redemocratização do Brasil. O governo usava como resposta, invariavelmente, a repressão policial.
Ante as manifestações, acentuou-se o processo de fechamento político com a dissolução do Congresso Nacional e a edição, em 13 de dezembro de 1968, do Ato Institucional nº 5 (AI-5), o mais duro de todas as leis do regime militar. Ele suspendia todas e quaisquer garantias constitucionais, dando ao presidente o controle absoluto sobre os destinos da nação. O pretexto usado pelo regime foi o discurso do deputado Márcio Moreira Alves, do MDB, incentivando o boicote popular ao desfile de 7 de setembro.
A partir do AI-5, inicia-se um período de intensa repressão. A oposição passa a ter espaços reduzidos, ficando quase imobilizada em suas ações. Assim, com os canais democráticos fechados, parcela da oposição decidiu-se pelo enfrentamento armado, com assaltos a bancos, seqüestros e atentados. Nessas ações, exigia-se a libertação de presos políticos e procurava-se arrendar fundos para o movimento. O esforço pouco adiantaria. Alguns anos depois, os grupos da luta armada estariam completamente derrotados, muitos militantes estariam mortos, outros exilados, quase todos submetidos aos rituais de tortura do regime militar.
Em agosto de 1969, o presidente Costa e Silva sofreu derrame e ficou impossibilitado de exercer duas funções. Conforme a Constituição em vigor, o vice-presidente Pedro Aleixo deveria assumir o poder. Mas os militares o consideram pouco confiável e para o seu lugar organizam uma junta militar, composta pelo general Lira Tavares, o almirante Augusto Rademaker e o brigadeiro Márcio de Souza Melo.
A junta permaneceu no poder até outubro do mesmo ano. Eleições indiretas foram convocadas para escolher o novo presidente. O nome apresentado pelos chefes militares – o do general Emílio Garrastazu Médici – foi aprovado sem esforço.


O GOVERNO DO GENERAL EMÍLIO GARRASTAZU MÉDICI (1970 – 1974)

O governo do general Médici caracterizou-se pelo milagre econômico, repressão à luta armada e intensa propaganda pró-regime militar. Tendo à frente das finanças o ministro Antônio Delfim Netto, o país alcançou excelentes índices de crescimento econômico, à custa do endividamento do país e do empobrecimento crescente da população. Afirmava o ministro que era preciso fazer crescer o bolo para depois dividi-lo: desculpas para estabelecer políticas de favorecimento e de concentração de renda.
O desenvolvimento econômico e a propaganda governamental trouxeram o apoio da classe média ao governo. O setor era o grande beneficiário da política econômica. A paz interna aparente era garantida com torturas e desaparecimento dos presos políticos trancafiados nos cárceres da ditadura.
Entre algumas realizações do governo Médici, destacam-se a construção da rodovia Transamazônica, a criação da Telecomunicações do Brasil (Telebrás), a conclusão de várias hidrelétricas e a criação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Foi ainda aprovada a emenda constitucional que ampliava os poderes do presidente, cujo mandato se estendeu de quatro para cinco anos.


O GOVERNO DO GENERAL ERNESTO GEISEL (1974 – 1979)

O presidente eleito indiretamente para substituir Médici foi o general Ernesto Geisel. Em seu governo surgiram os primeiros sinais de abertura política, exigida por diversos setores da sociedade civil, diante da crise econômica crescente.
Priorizando a questão energética e procurando contornar os problemas resultantes da crise mundial do petróleo, o governo estimulou o desenvolvimento do Programa Nacional do Álcool (Pró-álcool). O objetivo era promover a utilização de uma fonte de energia alternativa ao petróleo. Durante seu governo, teve início ainda a construção de duas das maiores hidrelétricas do mundo: Itaipu e Tucuruí.
Para promover a abertura política, o presidente Geisel substituiu alguns militares considerados mais radicais, os chamados linha dura do regime, dentre eles o comandante do II Exército, Eduardo D’Ávila Mello. Nas dependência do exército, sob sua responsabilidade, tinha ocorrido a morte sob tortura do jornalista e cineasta Vladimir Herzog e do operário Manuel Fiel Filho.
Buscando não perder o controle do processo de abertura, o general Geisel definia que a transição democrática deveria ser lenta e gradual. Frente ao crescimento da oposição, o presidente decretou, em 1976, a Lei Falcão, que limitava o acesso de candidatos ao rádio e à televisão nas eleições municipais, além de cassar os direitos políticos de parlamentares do MDB. Outra medida foi o Pacote de Abril, em 1977, estendendo o mandato presidencial para seis anos, a manutenção de eleições indiretas para governadores e a criação de senadores nomeados pelo governo, os senadores biônicos.
Em 1978, explodiu na região do ABC, em São Paulo, uma grande greve de metalúrgicos, liderada por Luís Inácio da Silva, o Lula. O movimento indicava o avanço das manifestações pela aceleração da abertura e da redemocratização do país. No final de seu governo, Geisel revogou o AI-5 e determinou a extinção da censura no Brasil.


O GOVERNO DO GENERAL JOÃO BATISTA FIGUEIREDO (1979 – 1985)

Para substituir Geisel, foi escolhido o general João Batista Figueiredo. Ele deparou com uma situação bastante grave: a dívida externa brasileira ultrapassava os 100 bilhões de dólares, a inflação excedia a casa dos 250% ao ano, greves e agitações políticas pipocavam por toda a parte, a imprensa livre trazia à tona sucessivos escândalos financeiros envolvendo membros do governo.
Continuando o processo de abertura política, o governo Figueiredo aprovou, em 1980, a Lei de Anistia. A partir de então, começaram a retornar ao país várias pessoas exiladas, assim como deixaram a cadeia muitos presos políticos.
Outra medida foi a reforma partidária, que extinguiu a Arena e o MDB e autorizou a formação de novos partidos políticos. A Arena transformou-se no Partido Democrático Social (PDS), o MDB deu lugar ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e inúmeros novos partidos surgiram. Dentre eles, destacam-se o Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido Democrático Trabalhista (PDT) e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). O fim do bipartidarismo representou a ampliação das liberdades democráticas.
Foram ainda autorizadas eleições diretas para governadores, as primeiras desde 1967. Realizadas em 1982, o PDS as venceu em 12 estados, reunindo um total de 18 milhões de votos. A oposição venceu em 10 estados, obtendo 25 milhões de votos. O avanço da oposição também se confirmou no legislativo, onde o governo perdeu a maioria que até então possuía na Câmara dos Deputados.
O processo de abertura, porém, não ocorreu sem reação de vários setores sociais e militares ligados aos aparelhos repressores da ditadura. Como não poderia deixar de ser, essa reação se expressou por meio da violência, como os ataques a bancas de jornais que vendiam publicações de oposição e atentados a entidades civis, entre elas a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Marco dessa escalada da violência foi a frustrada tentativa durante show de comemoração ao Primeiro de Maio, no Rio de Janeiro. Num carro parado no estacionamento do Riocentro, local onde se realizava a comemoração, explodiu uma bomba, que matou um sargento e feriu um capitão do exército. A bomba explodiu no momento em que esses militares se preparavam para realizar o atentado.
Apesar da violência, o processo de abertura não foi detido, graças à crescente atuação de setores da sociedade que se articulavam pelo retorno da democracia. Nesse período, no final de 1983, os partidos de oposição encamparam a campanha pela eleição direta para presidente da República. O movimento conhecido como Diretas-Já mobilizou o país de norte a sul, em manifestações que envolviam centenas de milhares de pessoas.
O movimento Diretas-Já visava pressionar o Congresso para aprovar a emenda constitucional apresentada pelo deputado federal Dante de Oliveira, com o objetivo de restituir as eleições diretas para presidente. A emenda, porém, foi derrotada por apenas 22 votos, numa sessão em que vários deputados deixaram de comparecer.
A escolha do novo presidente seria realizada, mais uma vez, pela via indireta. Formou-se então uma aliança de políticos moderados favoráveis à abertura. A Frente Liberal, como foi chamada, reunia tanto pessoas da oposição como antigos colaboradores do regime militar. A Frente garantiu para a oposição a maioria no Congresso.
Dois civis concorreram à sucessão presidencial: Tancredo Neves, da Frente Liberal, e Paulo Maluf, do PDS. A vitória coube a Tancredo Neves. Ele, entretanto, não assumiu o poder. Às vésperas de sua posse, foi hospitalizado e faleceu em 21 de abril de 1985. A presidência foi assumida, então, pelo vice José Sarney, um dos fiéis aliados do regime militar.
O final do governo Figueiredo e a posse de José Sarney marcaram o fim do regime militar. Iniciava-se uma nova fase na vida política brasileira, denominada Nova República.

PERÍODO DEMOCRÁTICO 1945 – 1964

SEGUNDA परते
GOVERNO JÂNIO QUADROS (1961)
Surpresas e contradições

Jânio da Silva Quadros, apoiado pela UDN, ganhou as eleições para a presidência com 48% da preferência do eleitorado e larga vantagem sobre o segundo colocado, o marechal Henrique Teixeira Lott, candidato da coligação PTB-PSD.
Em função da legislação eleitoral vigente naquele período, o presidente eleito podia ser de chapa e o vice-presidente de outra. Assim, foi eleito para a vice-presidência João Goulart, do PTB. Adversário de Jânio, o vice – mais conhecido como Jango - era considerado herdeiro político do getulismo.

O estilo Jânio
Jânio chegou à presidência da república coroando uma carreira política rápida e repleta de sucessos.
Em São Paulo, exerceu sucessivamente os cargos de vereador, deputado, prefeito da capital e governador do estado. Tinha um estilo político considerado por muitos analistas como exibicionista, moralista e demagógico. Conquistou grande parte do eleitorado prometendo combater a corrupção e varrer a sujeira da administração pública – o símbolo de sua campanha era uma vassoura.
Eleito presidente, Jânio tomou atitudes que surpreenderam, sobretudo porque se ocupou, pessoalmente, de assuntos corriqueiros. Por meio de bilhetinhos, escritos de próprio punho, dava ordens, como proibição de lança-perfumes no carnaval, das brigas de galo, das corridas de cavalo em dias de semana, do uso de biquínis em desfiles de beleza etc.
Jânio era contrário ao comunismo e queria manter o país aberto ao capital estrangeiro. No entanto, passou também a defender uma política externa independente das pressões das grandes potências. Providenciou o reatamento das relações diplomáticas do Brasil com a União Soviética e com a China comunista, provocando violentas críticas dos partidários da UDN e dos representantes das empresas multinacionais.
Em 19 de agosto de 1961, Jânio Quadros condecorou o ministro da Economia de Cuba, Ernesto “Che” Guevara, com a principal comenda brasileira: a Ordem do Cruzeiro do Sul. Era sua homenagem pública a um dos principais líderes da revolução socialista cubana de 1959.
Diante das atitudes do presidente, a UDN rompeu com o governo. Por meio de uma rede de televisão, o líder udenista Carlos Lacerda acusou Jânio de “abrir as portas do Brasil ao comunismo internacional”.
Apesar do prestígio popular, Jânio não contava com forças políticas organizadas na sociedade para sustentá-lo no poder. Sem o apoio da UDN, dos grandes empresários e dos grupos que dominavam a imprensa, o presidente tomou uma atitude inesperada: renunciou ao cargo em 25 de agosto de 1961, deixando uma carta, endereçada ao Congresso, na qual justificava sua atitude:
Forças terríveis levantam-se contra mim e me intrigam ou infamam (…). Se permanecesse, não manteria a confiança e a tranqüilidade, ora quebradas e indispensáveis ao exercício de minha autoridade (…). A mim não falta coragem da renúncia. (In: Edgard Carone. A quarta república (1945-1964). São Paulo, Difel, 1980, p. 181)
Sem demora, o Congresso aceitou o pedido de Jânio, cujo retorno à vida política só ocorreu em 1985, quando se reelegeu prefeito da cidade de São Paulo.

Crise para a posse de Goulart
A renúncia de Jânio ia ao encontro dos interesses udenistas e dos demais grupos de oposição. De acordo com as regras da Constituição, a presidência deveria ser entregue ao vice João Goulart, que estava em visita oficial à China comunista. A presidência da república foi, então, entregue ao presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli.
Dois grupos políticos se formaram, com posicionamentos diferentes em relação à posse de João Goulart. O grupo contrário, que o acusava de ser um “perigoso comunista”, reunia comandantes militares, políticos udenistas e grandes empresários nacionais e estrangeiros. O grupo favorável incluía uma parcela dos líderes sindicalistas e trabalhadores, profissionais liberais e pequenos empresários. Para representar este grupo foi organizada a Frente Legalista, que pretendia garantir a posse de Jango, em cumprimento da lei. Nascida no Rio Grande do Sul, a Frente Legalista era liderada pelo governador desse estado, Leonel Brizola (cunhado de Jango), e apoiada pelo comandante do III Exército, general Machado Lopes.
O confronto entre esses dois grupos parecia encaminhar o país a uma guerra civil. Para que isso não ocorresse, foi negociada uma solução política: o vice-presidente assumiria o poder, desde que aceitasse o sistema parlamentarista. Nesse sistema de governo, o presidente da república divide o poder Executivo com um primeiro-ministro indicado pelo Congresso Nacional.
João Goulart aceitou as condições e tomou posse na presidência em 7 de setembro de 1961. Tancredo Neves era o primeiro-ministro.
A emenda constitucional que estabeleceu o parlamentarismo previa que esse sistema de governo deveria ser referendado por um plebiscito. Realizado em 6 de janeiro de 1963, o plebiscito reuniu votos de mais de 12 milhões de cidadãos. Destes, quase 10 milhões manifestaram-se contra o parlamentarismo, votando pelo restabelecimento do presidencialismo.


GOVERNO JOÃO GOULART (1961-1964)
O nacionalismo reformista

Após o plebiscito, João Goulart assumiu a presidência e reforçou sua linha de governo nacionalista e reformista, mas eram muitos os problemas que precisava enfrentar.
Sua estratégia socioeconômica foi formalizada por meio do Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social, organizado por Celso Furtado, ministro do Planejamento. Esse plano tinha como objetivos:

· promover melhor distribuição das riquezas nacionais, desapropriando aos latifúndios improdutivos para defender interesse sociais;

· encampar as refinarias particulares de petróleo;

· reduzir a dívida externa brasileira;

· diminuir a inflação e manter o crescimento econômico sem sacrificar exclusivamente os trabalhadores;

A inflação e o custo de vida não paravam de subir. As despesas com as importações aumentavam, e caíam os preços das exportações. Diminuía o ritmo de crescimento da indústria. Os grandes empresários nacionais e estrangeiros reduziam os investimentos na produção, pois desconfiavam das intenções políticas de Jango. Temiam que o governo brasileiro implantasse o socialismo no Brasil – uma opção que parece remota para a maioria dos estudiosos daquele período.
O governo Goulart foi marcado por intensa mobilização social e política de diversos setores da sociedade brasileira: estudantes – ligados à União Nacional dos Estudantes (UNE) e à Juventude Universitária Católica (JUC) - , operários – ligados à Central Geral dos Trabalhadores (CGT) – e camponeses – ligados às Ligas Camponesas, que se difundiam principalmente pelo nordeste, tendo entre seus lideres o advogado socialista Francisco Julião.
Eram muitas as reivindicações sociais populares com a intenção de transformar o Brasil numa sociedade mais justa e igualitária. Francisco Julião denunciava que os camponeses do nordeste sobreviviam num regime de servidão, movendo-se dentro de um cenário trágico, de onde só emergem para ir habitar o mocambo, a favela, maloca, o cemitério. Não conhecem o berçário, a creche, a escola, a cultura, a saúde, a paz, o futuro, a vida. (In: Darcy Ribbeiro. Aos trancos e barrancos.)
Surgiram, em oposição aos movimentos sociais, algumas associações políticas, como o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (IPES), financiadas por empresários brasileiros e pelo governo e empresários dos Estados Unidos. Milhões de dólares eram gastos em propaganda contra o governo, por meio de livros, jornais, revistas, rádio e televisão. Os políticos de oposição recebiam verbas para financiar suas campanhas e, depois de eleitos, eram subornados para votar contra as propostas de Jango.
Reformas de base
Em 13 de março de 1964, João Goulart, falando a mais de 300 mil pessoas num comício em frente à estação da Central do Brasil (área de grande afluência popular no centro do Rio de Janeiro), expôs as dificuldades de seu governo e anunciou a necessidade de um conjunto de reformas de base para o país. Entre essas medidas, que acirravam ainda mais os ânimos das elites dominantes e contrariavam os interesses estrangeiros, estavam:

· reforma agrária - para facilitar o acesso à terra a milhões de lavradores que desejavam trabalhar e produzir no campo. Com melhores condições de vida e de trabalho, o morador do campo permaneceria em seu local de origem e não se dirigiria para as grandes cidades em busca de emprego;

· reforma educacional – para aumentar o número de escolas públicas, matricular todas as crianças brasileiras e combater o analfabetismo;

· reforma tributária – para corrigir as desigualdades sociais na distribuição dos deveres entre ricos e pobres, patrões e empregados;

Além das reformas de base, Jango procurou, pela Lei de Remessas de Lucros, limitar o envio de dólares das empresas multinacionais para o exterior. A aprovação dessa lei provocou forte reação entre representantes das multinacionais, bem como dos grupos políticos e defensores dos interesses estrangeiros.

Reações às reformas
A favor do governo, alguns setores populares faziam manifestações em apoio às reformas de base. Contra o governo, as oposições organizavam protestos como, por exemplo, a marcha da Família com Deus pela Liberdade, em São Paulo, passeatas de senhoras católicas, autoridades civis, empresários e parte da classe média.
A agitação política e social ganhava corpo no país. Os grupos de esquerda e de direita radicalizavam suas posições. Em Brasília, 600 sargentos do exército e da aeronáutica ocuparam a tiros suas guarnições para exigir o direito de voto. A rebelião dos sargentos foi controlada, mas os oficiais militares se assustaram com a indisciplina da tropa e responsabilizaram o governo pelo “clima de desordem”.
Em 31 de março, de 1964, explodiu a rebelião das forças armadas contra o governo João Goulart. O movimento militar teve início em Minas Gerais, apoiado pelo governador mineiro Magalhães Pinto. Rapidamente, os golpistas contaram com a adesão de outras unidades militares de São Paulo, do Rio Grande do Sul e do antigo estado da Guanabara (criado em lugar do Distrito Federal, situado na cidade do Rio de Janeiro, quando a capital federal foi transferida para Brasília, em 1960).
Sem condições de resistir ao golpe militar, o presidente João Goulart deixou Brasília em 1º de março de 1964. passou pelo Rio Grande do Sul e, em seguida, foi para o Uruguai como exilado político. Era o começo dos governos militares.

O PERÍODO DEMOCRÁTICO 1945 – 1964

PRIMEIRA PARTE

A CONSTITUIÇÃO DE 1946

Com o fim do Estado Novo, realizaram-se eleições gerais em todo o país. Para a presidência da república, foi eleito o general Eurico Gaspar Dutra. Também foram eleitos deputados federais e senadores com a missão de compor uma Assembléia Constituinte, encarregada de elaborar uma nova Constituição para o país. Entre os senadores, encontrava-se Getúlio Vargas, que não abandonara a vida política e fora eleito com expressivo número de votos.
Instalada em 2 de fevereiro de 1946, a Assembléia Constituinte era composta de representantes dos principais partidos políticos da época: PSD; UDN; PTB e PCB.
Depois de sete meses de trabalho legislativo, a nova Constituição brasileira foi promulgada, em 18 de setembro de 1946. Era uma Constituição liberal, que atendia mais aos interesses dos grandes empresários do que aos trabalhadores. De seu conteúdo, podemos destacar:

· Princípios básicos – estabelecimento da democracia como regime político da nação. Manteve-se a república como forma de governo, a federação como forma de Estado e o presidencialismo como sistema de governo. Ao contrário da centralização de poderes do Estado Novo, essa Constituição conferia poderes ao Legislativo, ao Executivo e ao Judiciário para que atuassem de modo independente e com equilíbrio de forças.

· Direito de voto – voto secreto e universal para os maiores de 18 anos. Continuavam sem direito ao voto analfabetos, cabos e soldados.

· Direito trabalhista – a legislação trabalhista da Era Vargas foi preservada, tendo como novidade a garantia constitucional do direito de greve para os trabalhadores, mediante apreciação da Justiça do Trabalho. Manteve-se o controle dos sindicatos de trabalhadores pelo governo.

· Mandatos eletivos - estabelecimento do mandato presidencial de cinco anos, proibindo-se a reeleição. Os deputados teriam mandato de quatro anos, permitindo-se reeleição. Os senadores teriam mandato de oito anos, sendo em número de três para cada estado da federação.

A Constituição de 1946, que vigorou até 1864, garantia ao cidadão o direito à liberdade de pensamento, crença religiosa, expressão e associação de classe. Mas, na prática das relações sociais, grande parte desses direitos não foram garantidos pelo Poder Judiciário. Nessa época, como em outros períodos, permaneceu no Brasil uma considerável distância entre o país legal e o país real. Até hoje, milhões de brasileiros não dispõem de possibilidades concretas de reivindicar seus direitos junto aos órgãos da justiça.


GOVERNO DUTRA (1946-1950)
Guerra Fria e anticomunismo

O governo do general Dutra foi influenciado pelos acontecimentos internacionais que marcaram o pós-guerra. Entre os vencedores da guerra destacaram-se duas grandes potências: os Estados Unidos, liderando o bloco dos países capitalistas, e a União Soviética, liderando o bloco dos países socialistas. Tensões e conflitos entre esses dois blocos marcaram o período conhecido como Guerra Fria.
Nesse contexto histórico, o governo Dutra aliou-se ao bloco liderado pelo governo dos Estados Unidos, e uma das conseqüências dessa aliança foi o rompimento de relações diplomáticas com a União Soviética, em 1947. Internamente, o governo Dutra, cumprindo decisão do Supremo Tribunal Federal, pôs o Partido Comunista Brasileiro (PCB) na ilegalidade. Todos os parlamentares eleitos por esse partido, entre eles Luís Carlos Prestes (senador), tiveram seus mandatos cassados, acusados principalmente de receber dinheiro e orientação da União Soviética. A vida legal do PCB durou pouco mais de dois anos e meio.
Em relação aos trabalhadores urbanos, o governo agiu de modo autoritário. Os operários faziam greves em várias regiões do país, reclamando dos baixos salários, que não aumentavam havia anos, enquanto o custo de vida continuava subindo. A equipe do governo Dutra defendia que, para combater a inflação, não podia autorizar aumentos salariais. Em nome do combate ao comunismo, o governo suspendeu o direito de greve, interveio em 143 sindicatos e prendeu vários líderes operários.

Novas diretrizes econômicas
Procurando criar uma política de investimentos em setores considerados prioritários – saúde, alimentação, transporte e energia – o governo Dutra elaborou o Plano Salte, sigla formada pelas iniciais desses setores. Sem dinheiro suficiente e competência administrativa, o governo realizou poucos dos objetivos do plano, entre eles a conclusão da rodovia Rio-São Paulo, denominada rodovia Presidente Dutra.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o lucro com as exportações brasileiras superou as despesas com a importação. Assim, o governo conseguiu os compromissos de sua dívida externa e ainda acumular reservas cambiais de milhões de dólares.
No mandato de Dutra, o nacionalismo econômico da Era Vargas foi abandonado: abriu-se a economia do país às empresas estrangeiras, sem a preocupação de incentivar o desenvolvimento industrial nacional. Com essa política de abertura ao produto estrangeiro, o governo Dutra facilitou a importação de bens supérfluos (como brinquedos de plástico, aparelhos de televisão, automóveis, meias de náilon, geladeiras e aparelhos de rádio) e a compra de ferrovias inglesas que haviam sido instaladas no Brasil no século XIX.
Os líderes das entidades industriais brasileiras protestaram contra a liberação indiscriminada das importações, que prejudicava a comercialização dos produtos nacionais. Eles lutavam por uma política de seleção de importações, voltada para a compra de bens de produção (máquinas e equipamentos industriais, combustíveis etc.). Pressionado por grupos nacionalistas, o governo Dutra passou a dificultar as importações, mas já era tarde. Em dois anos, quase 80% da reserva cambial brasileira havia acabado.


O GOVERNO VARGAS (1951-1954)
Nacionalismo e trabalhismo

Nas eleições presidenciais para a sucessão de Dutra, Getúlio Vargas concorreu e venceu, recebendo 48,7% dos votos. O segundo lugar coube ao brigadeiro Eduardo Gomes (UDN) com 29,7% dos votos.
Getúlio dizia que voltava ao poder não apenas como líder político, mas como líder popular. Para conseguir aliados, procurou apagar a imagem de ditador do Estado Novo e construir uma nova figura, de homem democrático.
Já na presidência, retomou duas diretrizes que associara à sua imagem pública: o nacionalismo econômico e a política trabalhista.

O nacionalismo
Vargas empenhou-se em realizar um governo nacionalista, afirmando que era “preciso atacar a exploração das forças internacionais” para que o país conquistasse sua “independência econômica”.
O nacionalismo era duramente combatido pelos representantes do governo dos Estados Unidos e pelos dirigentes das empresas estrangeiras instaladas no Brasil. Havia no Congresso Nacional e na imprensa um grande debate político entre os “nacionalistas” , que apoiavam o governo, e os “internacionalistas”, que pretendiam reabrir a economia do país ao capital estrangeiro. Os nacionalistas chamavam seus adversários de “entreguistas”, acusando-os de querer entregar as riquezas do país à livre exploração estrangeira.
Um dos principais momentos do debate entre os nacionalistas e seus adversários aconteceu por ocasião na nacionalização do petróleo. Os nacionalistas queriam que a exportação do petróleo no Brasil fosse realizada por uma empresa estatal brasileira, e criaram o slogan O petróleo é nosso. Seus oponentes defendiam a exploração do petróleo por grupos internacionais.
A campanha teve um final favorável aos nacionalistas, com a fundação, em 1953, da Petrobras, empresa estatal responsável pelo monopólio da extração e, parcialmente, pelo refino do petróleo brasileiro.
Ainda em 1953, o governo propôs uma Lei de Lucros Extraordinários, que limitava a remessa ao exterior dos lucros das empresas estrangeiras estabelecidas no Brasil. A lei, entretanto, foi barrada no Congresso, devido as pressões de grupos internacionais.
Os adversários do nacionalismo promoveram, então, intensa reação à política de Vargas. O governo dos Estados Unidos mostrava seu desagrado pela criação da Petrobrás e pela Lei de Lucros. A UDN, principal partido de oposição ao governo, e os setores ligados ao capital estrangeiro começaram a conspirar para derrubar Vargas. Um dos principais líderes da oposição era Carlos Lacerda, político ligado à UDN e diretor do jornal Tribuna da Imprensa.

O trabalhismo
Para os trabalhadores urbanos, Vargas dizia que seu objetivo era a construção de uma “verdadeira democracia social e econômica”, em que cada um tivesse, além dos direitos políticos, o direito a desfrutar do progresso que ajudou a construir.
Em 1954, Vargas autorizou um aumento de 100% no salário mínimo, atendendo à proposta do ministro do Trabalho, João Goulart. Essa medida provocou enormes protestos entre os patrões.
Durante essa fase do governo Vargas, o salário mínimo recuperou significativamente seu poder aquisitivo.

Crise política
Os políticos da UDN e a imprensa de oposição atacavam duramente o governo Vargas, acusando-o de corrupção.
Em 5 de agosto de 1954, o líder oposicionista Carlos Lacerda foi vítima de um atentado, ocorrido na rua Toneleiros, em Copacabana, Rio de Janeiro. Lacerda escapou com vida, com um tiro no pé, mas o major da aeronáutica Rubem Vaz, que o acompanhava, morreu.
As investigações posteriores ao crime, conduzidas pela aeronáutica, indicavam que o assassino cumpria ordens de Gregório Fortunato, chefe da guarda presidencial.
As notícias sobre o crime da rua Toneleiros tiveram grande repercussão na imprensa antigetulista. A oposição multiplicava os ataques ao governo federal e tramava derrubar o presidente.
Nos dias 22 e 23 de agosto, manifestações de oficiais militares exigiram a renúncia de Getúlio Vargas, que se recusava a deixar o cargo, embora não tivesse condições para reagir. Isolado politicamente, no dia 24, escreveu uma carta-testamento ao povo brasileiro e, em seguida, suicidou-se com um tiro no coração.
A notícia da morte e a divulgação de sua carta-testamento estimualram manifetações populares por todo o país. Jornais antigetulistas foram invadidos e quebrados, assim como diretórios da UDN e a embaixada dos Estados Unidos no Rio de Janeiro. A morte de Vargas comoveu grande parte da população. Milhares de pessoas compareceram ao seu enterro.
Nos meses que ainda faltavam para completar o mandato de Vargas, a presidência da república foi exercida inicialmente por Café Filho (vice-presidente), afastado por motivos de saúde. Depois, foi provisoriamente ocupada por Carlos Luz (presidente da Câmara dos Deputados) e em seguida por Nereu Ramos (presidente do Senado).

O PERÍODO DEMOCRÁTICO 1945 – 1964

PRIMEIRA PARTE

A CONSTITUIÇÃO DE 1946

Com o fim do Estado Novo, realizaram-se eleições gerais em todo o país. Para a presidência da república, foi eleito o general Eurico Gaspar Dutra. Também foram eleitos deputados federais e senadores com a missão de compor uma Assembléia Constituinte, encarregada de elaborar uma nova Constituição para o país. Entre os senadores, encontrava-se Getúlio Vargas, que não abandonara a vida política e fora eleito com expressivo número de votos.
Instalada em 2 de fevereiro de 1946, a Assembléia Constituinte era composta de representantes dos principais partidos políticos da época: PSD; UDN; PTB e PCB.
Depois de sete meses de trabalho legislativo, a nova Constituição brasileira foi promulgada, em 18 de setembro de 1946. Era uma Constituição liberal, que atendia mais aos interesses dos grandes empresários do que aos trabalhadores. De seu conteúdo, podemos destacar:

· Princípios básicos – estabelecimento da democracia como regime político da nação. Manteve-se a república como forma de governo, a federação como forma de Estado e o presidencialismo como sistema de governo. Ao contrário da centralização de poderes do Estado Novo, essa Constituição conferia poderes ao Legislativo, ao Executivo e ao Judiciário para que atuassem de modo independente e com equilíbrio de forças.

· Direito de voto – voto secreto e universal para os maiores de 18 anos. Continuavam sem direito ao voto analfabetos, cabos e soldados.

· Direito trabalhista – a legislação trabalhista da Era Vargas foi preservada, tendo como novidade a garantia constitucional do direito de greve para os trabalhadores, mediante apreciação da Justiça do Trabalho. Manteve-se o controle dos sindicatos de trabalhadores pelo governo.

· Mandatos eletivos - estabelecimento do mandato presidencial de cinco anos, proibindo-se a reeleição. Os deputados teriam mandato de quatro anos, permitindo-se reeleição. Os senadores teriam mandato de oito anos, sendo em número de três para cada estado da federação.

A Constituição de 1946, que vigorou até 1864, garantia ao cidadão o direito à liberdade de pensamento, crença religiosa, expressão e associação de classe. Mas, na prática das relações sociais, grande parte desses direitos não foram garantidos pelo Poder Judiciário. Nessa época, como em outros períodos, permaneceu no Brasil uma considerável distância entre o país legal e o país real. Até hoje, milhões de brasileiros não dispõem de possibilidades concretas de reivindicar seus direitos junto aos órgãos da justiça.


GOVERNO DUTRA (1946-1950)
Guerra Fria e anticomunismo

O governo do general Dutra foi influenciado pelos acontecimentos internacionais que marcaram o pós-guerra. Entre os vencedores da guerra destacaram-se duas grandes potências: os Estados Unidos, liderando o bloco dos países capitalistas, e a União Soviética, liderando o bloco dos países socialistas. Tensões e conflitos entre esses dois blocos marcaram o período conhecido como Guerra Fria.
Nesse contexto histórico, o governo Dutra aliou-se ao bloco liderado pelo governo dos Estados Unidos, e uma das conseqüências dessa aliança foi o rompimento de relações diplomáticas com a União Soviética, em 1947. Internamente, o governo Dutra, cumprindo decisão do Supremo Tribunal Federal, pôs o Partido Comunista Brasileiro (PCB) na ilegalidade. Todos os parlamentares eleitos por esse partido, entre eles Luís Carlos Prestes (senador), tiveram seus mandatos cassados, acusados principalmente de receber dinheiro e orientação da União Soviética. A vida legal do PCB durou pouco mais de dois anos e meio.
Em relação aos trabalhadores urbanos, o governo agiu de modo autoritário. Os operários faziam greves em várias regiões do país, reclamando dos baixos salários, que não aumentavam havia anos, enquanto o custo de vida continuava subindo. A equipe do governo Dutra defendia que, para combater a inflação, não podia autorizar aumentos salariais. Em nome do combate ao comunismo, o governo suspendeu o direito de greve, interveio em 143 sindicatos e prendeu vários líderes operários.

Novas diretrizes econômicas
Procurando criar uma política de investimentos em setores considerados prioritários – saúde, alimentação, transporte e energia – o governo Dutra elaborou o Plano Salte, sigla formada pelas iniciais desses setores. Sem dinheiro suficiente e competência administrativa, o governo realizou poucos dos objetivos do plano, entre eles a conclusão da rodovia Rio-São Paulo, denominada rodovia Presidente Dutra.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o lucro com as exportações brasileiras superou as despesas com a importação. Assim, o governo conseguiu os compromissos de sua dívida externa e ainda acumular reservas cambiais de milhões de dólares.
No mandato de Dutra, o nacionalismo econômico da Era Vargas foi abandonado: abriu-se a economia do país às empresas estrangeiras, sem a preocupação de incentivar o desenvolvimento industrial nacional. Com essa política de abertura ao produto estrangeiro, o governo Dutra facilitou a importação de bens supérfluos (como brinquedos de plástico, aparelhos de televisão, automóveis, meias de náilon, geladeiras e aparelhos de rádio) e a compra de ferrovias inglesas que haviam sido instaladas no Brasil no século XIX.
Os líderes das entidades industriais brasileiras protestaram contra a liberação indiscriminada das importações, que prejudicava a comercialização dos produtos nacionais. Eles lutavam por uma política de seleção de importações, voltada para a compra de bens de produção (máquinas e equipamentos industriais, combustíveis etc.). Pressionado por grupos nacionalistas, o governo Dutra passou a dificultar as importações, mas já era tarde. Em dois anos, quase 80% da reserva cambial brasileira havia acabado.


O GOVERNO VARGAS (1951-1954)
Nacionalismo e trabalhismo

Nas eleições presidenciais para a sucessão de Dutra, Getúlio Vargas concorreu e venceu, recebendo 48,7% dos votos. O segundo lugar coube ao brigadeiro Eduardo Gomes (UDN) com 29,7% dos votos.
Getúlio dizia que voltava ao poder não apenas como líder político, mas como líder popular. Para conseguir aliados, procurou apagar a imagem de ditador do Estado Novo e construir uma nova figura, de homem democrático.
Já na presidência, retomou duas diretrizes que associara à sua imagem pública: o nacionalismo econômico e a política trabalhista.

O nacionalismo
Vargas empenhou-se em realizar um governo nacionalista, afirmando que era “preciso atacar a exploração das forças internacionais” para que o país conquistasse sua “independência econômica”.
O nacionalismo era duramente combatido pelos representantes do governo dos Estados Unidos e pelos dirigentes das empresas estrangeiras instaladas no Brasil. Havia no Congresso Nacional e na imprensa um grande debate político entre os “nacionalistas” , que apoiavam o governo, e os “internacionalistas”, que pretendiam reabrir a economia do país ao capital estrangeiro. Os nacionalistas chamavam seus adversários de “entreguistas”, acusando-os de querer entregar as riquezas do país à livre exploração estrangeira.
Um dos principais momentos do debate entre os nacionalistas e seus adversários aconteceu por ocasião na nacionalização do petróleo. Os nacionalistas queriam que a exportação do petróleo no Brasil fosse realizada por uma empresa estatal brasileira, e criaram o slogan O petróleo é nosso. Seus oponentes defendiam a exploração do petróleo por grupos internacionais.
A campanha teve um final favorável aos nacionalistas, com a fundação, em 1953, da Petrobras, empresa estatal responsável pelo monopólio da extração e, parcialmente, pelo refino do petróleo brasileiro.
Ainda em 1953, o governo propôs uma Lei de Lucros Extraordinários, que limitava a remessa ao exterior dos lucros das empresas estrangeiras estabelecidas no Brasil. A lei, entretanto, foi barrada no Congresso, devido as pressões de grupos internacionais.
Os adversários do nacionalismo promoveram, então, intensa reação à política de Vargas. O governo dos Estados Unidos mostrava seu desagrado pela criação da Petrobrás e pela Lei de Lucros. A UDN, principal partido de oposição ao governo, e os setores ligados ao capital estrangeiro começaram a conspirar para derrubar Vargas. Um dos principais líderes da oposição era Carlos Lacerda, político ligado à UDN e diretor do jornal Tribuna da Imprensa.

O trabalhismo
Para os trabalhadores urbanos, Vargas dizia que seu objetivo era a construção de uma “verdadeira democracia social e econômica”, em que cada um tivesse, além dos direitos políticos, o direito a desfrutar do progresso que ajudou a construir.
Em 1954, Vargas autorizou um aumento de 100% no salário mínimo, atendendo à proposta do ministro do Trabalho, João Goulart. Essa medida provocou enormes protestos entre os patrões.
Durante essa fase do governo Vargas, o salário mínimo recuperou significativamente seu poder aquisitivo.

Crise política
Os políticos da UDN e a imprensa de oposição atacavam duramente o governo Vargas, acusando-o de corrupção.
Em 5 de agosto de 1954, o líder oposicionista Carlos Lacerda foi vítima de um atentado, ocorrido na rua Toneleiros, em Copacabana, Rio de Janeiro. Lacerda escapou com vida, com um tiro no pé, mas o major da aeronáutica Rubem Vaz, que o acompanhava, morreu.
As investigações posteriores ao crime, conduzidas pela aeronáutica, indicavam que o assassino cumpria ordens de Gregório Fortunato, chefe da guarda presidencial.
As notícias sobre o crime da rua Toneleiros tiveram grande repercussão na imprensa antigetulista. A oposição multiplicava os ataques ao governo federal e tramava derrubar o presidente.
Nos dias 22 e 23 de agosto, manifestações de oficiais militares exigiram a renúncia de Getúlio Vargas, que se recusava a deixar o cargo, embora não tivesse condições para reagir. Isolado politicamente, no dia 24, escreveu uma carta-testamento ao povo brasileiro e, em seguida, suicidou-se com um tiro no coração.
A notícia da morte e a divulgação de sua carta-testamento estimualram manifetações populares por todo o país. Jornais antigetulistas foram invadidos e quebrados, assim como diretórios da UDN e a embaixada dos Estados Unidos no Rio de Janeiro. A morte de Vargas comoveu grande parte da população. Milhares de pessoas compareceram ao seu enterro.
Nos meses que ainda faltavam para completar o mandato de Vargas, a presidência da república foi exercida inicialmente por Café Filho (vice-presidente), afastado por motivos de saúde. Depois, foi provisoriamente ocupada por Carlos Luz (presidente da Câmara dos Deputados) e em seguida por Nereu Ramos (presidente do Senado).